18 dezembro 2003

à chuva

Os dias passam lentos com cheiros de tristeza e artefactos de solidão.
Sobram-me as cores que ficam retidas no pincel, mas que iluminam o VER de quem se sente bem à chuva, como quem chora com os olhos DELE!

11 dezembro 2003

sem resposta

Há reflexos de Deus em todas as perguntas que me intersectam o espírito e para as quais não encontro resposta.

09 dezembro 2003

silêncios

As palavras perdem-se no filtro da disponibilidade. Ficam como que arquivadas à espera de uso para nascerem em composição.
O tempo que não se inventa, actua como filtro de silêncios e de transparências do poema que procura desesperadamente a cor...

05 dezembro 2003

a rapariga de olhos tristes que carregava poesia

Passeava-me sem direcção, de olhos recolhidos na calçada, protegido do cinzento da chuva, quando, sobressaltado me interromperam os pensamentos vagos que me entretiam o Ver.
“Posso fazer uma pergunta?”
Invadido por uma silhueta de olhos tristes, pausei o Tempo de resposta no intuito de me recolocar no movimento quotidiano que borbulhava no redor e saiu-me resposta receosa.
“Pode, claro que pode!”
“ Gosta de literatura?”Que raio de pergunta, pensei.
“De alguma”, respondi em impulso incomodado.
Fixei o rosto parado que me inquiria e insultei-me. “ Mais um louco! Continuo a atrair os loucos desta terra! Pareço um íman descontrolado que atrai a demência! Tenho que me revisitar no Espelho! Por que raio vem todos ter comigo?”
Não tinha ainda terminado os fluxos de introspecção íntima, quando fui atropelado com mais uma pergunta.
“ E poesia?”
É demais, gesticulei interiormente.
“ Poesia? Não, poesia não!”
Estúpido! Anormal! Cobarde! Foi o insulto que me auto-flagiou.
“ O Senhor, não depende da poesia?
Não! Na verdade não estava nos meus dias e não fui capaz de resposta. Acelerei os passos, que já andavam meio perdidos e fugi, evitando cruzar olhares.
A vontade impelia-me para voltar atrás e continuar a conversa e dar-lhe outro rumo. Senti-me personagem de Jostein Gaarder do livro a Rapariga das laranjas.
Mas a minha rapariga da “poesia de olhos tristes” desaparecera definitivamente, escondida na multidão que subia-descia o Chiado.
Queria dizer-lhe que não, que não dependia da poesia, que dependia da água, do sol, do trabalho, mas que no fundo, no fundo era a poesia que me orientava o VER. Era a poesia que me pintava as cores da alma.
Revisitei o local na esperança de reencontrar a rapariga mas o momento, o instante, o poema estava irremediavelmente perdido.Sobejaram as palavras não ditas, restou o sonho de um reencontro, restou a poesia de uns olhos tristes que me retirou dos passos da multidão.

02 dezembro 2003

quando as árvores se transformam em vitrais que dançam com o vento.

Percorri riachos, bordados a musgo e a cogumelos tristes, escondido do Tempo.
Passeei-me em busca de tonalidades, como quem percorre a estrada do Destino, atento aos sons, aos odores e aos verdes repintados de amarelo-vermelho.
Sentei-me a contemplar as árvores transformadas em velas de altar sem tecto que me sorriam e me impediam os passos.
Só quando a luz estremeceu em sombra, e apagou os vitrais que dançavam com o vento, retomei o Tempo, que aguardava por mim junto ao asfalto.

28 novembro 2003

na corda bamba

Cortei o chão em passos fundos, com a raiva de uma charrua, em linha recta sem destino, com a alma de saltimbanco em equilibro trapezista.
Silêncio, por favor!
Não! não toquem o tambor, fechem os olhos, deixem-me olhar sozinho o caminho!

27 novembro 2003

pedras sem vida

Caiu no chão
só,
desamparada,
sem mão estendida,
sem nada
vazia,
sem escada,
lágrima,
contida,
encharcada.
silêncios
de pedra,

desamparada.

26 novembro 2003

o desgaste da vida

Os acasos colocaram-me perante a decomposição da consciência, obrigando-me a RE-VER o conceito de realidade sob o prisma da loucura, e aceitá-la de forma paciente e reflectiva.
Convivo com a demência, causada pelo desgaste da Vida, que se arrasta no dia, parada num Tempo “Alzaimeriano”, onde a percepção da "visão" toma outros contornos.
Entrar e perceber a vivência de um idoso é abrir uma porta para uma dimensão desconhecida que nos obriga a vasculhar a sensibilidade no nosso mais profundo conceito de humanidade.
O ritmo das ilusões, intercalam-se no “surreal”, ao ponto de nos envolver num quadro sem cor, onde tudo é possível, e o inexistente toma forma, volume e vida.
Conviver e aceitar esta relação com o desmoronar dos sentidos é um desafio ao Amor, onde o sentimento deixa de ter dimensão.

20 novembro 2003

esmola

Fitou-me em olhar fundo, criança cigana, seca de lágrima com face cortada em rugas de vida. Pedia beijos de esmola e caminho para andar sem olhar o chão...

19 novembro 2003

dúvida ocidental

Quando se admira o Mestre, fica-nos a dúvida se devemos correr a seu lado, ou usando o seu Saber, cortamos a meta à sua frente...

18 novembro 2003

afectos

Os afectos são como lâminas afiadas, ora deslizam suaves como pena pelos sentidos, ora golpeiam, sem aparente dor, em lágrimas de sangue, em choro sem som.

17 novembro 2003

Duas papoilas, uma mesa, e um pensador ausente que não queria ficar no quadro, mas ficou...

Uma enorme vontade, transfigurada em impulso, devolveu-me as cores, os pincéis, e uma luminosidade, que transformou uma esguia tela em duas grandiosas papoilas, vermelho amarelo, que se acomodaram no quadro. Ao longe, em plano segundo, nasceu uma mesa elíptica que se metamorfoseou em silhueta humana quase transparente. Traço contínuo de desenhador impaciente. Em jeito de fundo, em cama de cores, pincelei tons de amarelo-verde torado de forma a por as papoilas a dançar à frente do pensador transformado em mesa. Não me perguntem qual o significado do impulso materializado em cor, não sei resposta. A verdade é que naquele momento era só eu e as cores que se envolveram numa fuga ao atropelo dos últimos dias. É uma forma diferente de nos vermos reflectidos no espelho e de nos descobrimos no silêncio como quem vasculha a alma que se encolheu com o frio que nos cegou, no quotidiano que se nos impôs, ao som de uma trovoada desmedida.

16 novembro 2003

retrato de um domingo

A falta de tabaco, que permitisse alimentar a pequena fornalha que me aromatiza o pensamento e confesso o bem-estar, encaminharam-me os passos para uma das catedrais do consumo, espalhadas por esse país fora. Sim também esta pequena cidade algures no coração deste pequeno País tem uma, aberta domingo, dia de repouso e reflexão. Quando se pensa em tabaco, (mesmo que inalado por cachimbo, forma mais pachorrenta de dar cabo dos pulmões e de outros sistemas naturalmente robotizados que nos mantém de pé para saborear os limitados Domingos que nos foram destinados), surge a ideia da inevitável cafeína, por isso lá fui eu, resoluto a sentar-me numa das mesas, bem no centro daquela impessoal floresta de mesas e cadeiras, que a dita grande superfície comercial disponibiliza aos seus fiéis crentes. Sentei-me, envolvi-me nos odores do fumo que expelia e serenamente, calmamente, descontraidamente olhei. Na já ilustrada selva, centenas de olhos, debruçados ora em tigelas enormes, ora em pedaços de pão, ora em mini-pratos , besuntados de gordura, naturalmente também eles, serenos, e descontraídos ali estavam a consumir o seu Domingo, como quem rasga mais uma folha do calendário da Existência.

15 novembro 2003

rotina

Os olhos frios, fixaram-me, como animal furtivo que na escuridão da selva segue o movimento da presa que se esconde no vento. Paro. Oiço-me, em batuque acelerado e interrogo-me. Silenciado com a ausência, sinto-me parte de um jogo para que não fui convidado. Já não me olham. Agora quem fita é o medo. O impulso corre o chão que me foge e fica longe, escondido no escuro. Abro a torneira, que também fria me acorda, e se mistura em gestos quotidianos, que nos prendem à rotina do amanhecer.
O dia começa, e já não me interrogo, sigo. Só mais tarde me reconheço no olhar. É assim todos os dias. É assim a rotina de quem se perde no horizonte só depois de se reconhecer no olhar.

09 novembro 2003

quando não estamos prontos para nos desnudarmos

“Qual é a sua opinião?”
Atordoado, com a interiorização da pergunta, apenas se conseguiu questionar. “ Que raio de interrogatório é este?” Foi o que lhe veio à imagem, porque as palavras estilhaçaram-se sem sentido. “ A minha opinião?”, “ Mas para que querem a minha opinião?” Ficou incomodado, remexeu-se frenético na cadeira e zangou-se com o cachimbo (fiel companheiro) que inoportunamente resolvera apagar-se.
Não sabe ao certo quanto tempo se ausentou entre a pergunta e a resposta que não tinha.
Levara a vida inteira a gerir consensos e opiniões alheias e agora, inesperadamente queriam apoderar-se dos seus pensamentos, a ele que os guardava ciosamente como tesouros?
Não, não estava preparado para se desnudar!
Reacendeu o cachimbo, encolhido na palma da mão, interiorizou o aroma e expeliu lentamente os pensamentos em fumo azul cinzento. Ali estava a sua opinião, materializada em nuvem. Se a quisessem de facto, voltariam a perguntar ou juntavam as palavras que lentamente se eclipsavam na atmosfera densa daquela sala recheada de executivos e de decisores dos destinos de ninguém.
Quando fixou os olhos nos olhares, sentiu o silêncio da espera,”querem ver que a querem mesmo?”, pensou. Sentiu-se encurralado, endireitou os papeis desalinhados e fez ouvir o bater das folhas na mesa infinda e recolocou-os, direitos e perfilados. Estava terrivelmente cansado.
Sabia que dissesse o que dissesse, a discussão continuaria no mesmo diálogo de surdos, porque cada um continuava a ouvir se a si próprio. Tinha sido sempre assim durante toda a sua vida, e hoje não seria diferente. Era esse o seu grande segredo, porque geralmente, era o único que ouvia, media, ponderava e decidia, longe do barulho, sossegado com o seu fiel companheiro de reflexões.Voltou a reacender o cachimbo, “ Até este hoje embirra comigo!”, pensou. Pausadamente, solenemente, disse – “o gato pintou-se às riscas azuis!”.
Como esperava, o gorgolejo opinativo continuou, terminando horas depois, quando todos, cansados de se ouvirem a eles próprios, acordaram data de nova sessão…

07 novembro 2003

escultura colectiva

Quando o vazio nos enche a alma de interrogações, normalmente refugiamo-nos em recordações que tentam iludir as percepções do presente, e por momentos, breves é certo, julgamo-nos senhores da vida. Controlamos os sentidos, escolhemos as cores que envolvem o olhar, e lá no fundo, bem no fundo do sentir, descobrimos que sabemos sorrir, que fomos premiados por afectos, e que essa existência nos permite jogar aos dados com a vida.
Não fossem essas recordações, essas viagens por uma realidade que é só nossa, não conseguiríamos perceber a infinidade de acasos que nos moldaram o carácter. Somos mais do que uma simples escultura, de um único artista, de um único pintor, somos obra colectiva que não existiria se um único dos acasos que se cruzou na nossa vida se perdesse noutros caminhos, noutras direcções, noutras existências.

06 novembro 2003

sem timoneiro

Preciso de Espaço para sentir o TEMPO e de me abstrair desta muralha infinita que me desfoca os sentidos.Invento-me num barco à vela, sem timoneiro, orientado pela fuga.
A viagem perde-se nos atropelos das recordações que afundam o barco e me devolvem, sem pedir licença, para um espaço que me agrilhoa o VER!

04 novembro 2003

exercício de liberdade: introdução

Quero andar por aí. Invisível, ausente, submerso, para sentir o Vento, os sons e as cores. Não me quero em Mim, que me enegreço!
Não me digam o nome, não me vejam os olhos, não me oiçam os gritos. Hoje, pura e simplesmente não Existo!

03 novembro 2003

a vida de um lápis

O lápis corre à procura da imagem que sem nexo e sem harmonia vai desenhando o Tempo. Salta barreiras que o autor esconde e indelicadamente, põe-se a escutar, como quem sorri ao som de uma melodia, escondido atrás de uma flor.
O ambiente criado, pelo lápis paciente e sapiente, soltam o autor, que animado, baralha as palavras e lança-as no papel como quem se diverte no Jogo da Vida.
Não procura o sentido do que escreve. Está ali apenas a fazer companhia, aquele lápis irreverente que lhe espicaça a Consciência e as imagens que reteve do caminho. É uma companhia silenciosa que os complementam. Vivem à procura do entendimento e do respeito pela comunhão que lhes alimenta a poesia. Seguem-se, unos, com o mesmo ritmo, com uma só sombra.

30 outubro 2003

provavelmente haverá outras…

É com alguma imaginação que tem sido possível encarar a vida com alguma serenidade, e continua capacidade para compreender as motivações dos outros, permitindo-me a abertura de espírito suficiente, para sorrir e ver poesia, mesmo que pintada de uma enorme solidão.
Estou convencido, que só é possível manter uma relação afectiva (neste nosso novo mundo empregando de egocentrismo, e consequente egoísmo) se estivermos dispostos a Dar, sem estarmos à espera do Receber. Isto porque se esperamos retorno, mais tarde ou mais cedo, iremos perceber que ele se perdeu algures no calor de quem o recebeu e que se esquece que o amor é um conjunto de reflexos de um espelho que só existe se reflectir a imagem que lhe pomos no sonho.
A minha forma de estar na vida, baseia-se no facto de não haver conquista. Pura e simplesmente ESTOU! Sou um observador atento que se diverte com o OLHAR, sem estar a espera de agarrar e de possuir nada do que vejo, nada do que sinto. Nada é meu, tudo é da Vida! Foi a forma que encontrei, para me sentir capaz de andar pelos meus caminhos, sem demasiadas quedas. Provavelmente haverá outras…

29 outubro 2003

o horizonte amuado

Falei com um ponto, focalizado algures no horizonte, que mudo, ria-se da humanidade.
Não consigo perceber se fiquei irritado, com aquela entidade abstracta que me absorvia o olhar, ou triste com a própria humanidade. Engoli em seco e concentrei-me num quadro em tons de vermelho com gotas de amarelo escuro.
Terminada a pintura, virei o quadro para a parede e imaginei-lhe outras cores e sorri para aquele anjo mudo e surdo escondido no horizonte, que amuado fugiu com o quadro.

28 outubro 2003

história de um livro cansado

Sujei uma folha branca de palavras que desenhavam o reflexo de uma gaivota que se escondia de um gato que não gostava do Mar.
A folha, transfigurou-se em Livro, cansado de contar a história que se ocultava nas pegadas cortadas na areia da praia. As páginas, revoltadas, transformaram-se em ondas que se divertiam com o gato que olhava a gaivota que cheirava a peixe.
Nem o gato gostava do mar, nem o mar da gaivota, nem a gaivota do gato, por isso o Livro sacudiu as paginas que semearam a areia de palavras que desenharam as pegadas de um pescador que pintava ondas, em tons de branco azul.
Foi assim, que a folha, transformada em livro, passou a ter a cor dos olhos do pescador pintor que gostava do mar, do gato e da gaivota.

Pescador = Pintor, criador
Gato = criatura
Gaivota = criatura
Livro cansado = o que ensina a Amar
Pegadas cortadas na areia = sinais do criador que a criatura não vê porque não olha para trás
Onda = movimento, vidaBranco azul = branco azul

27 outubro 2003

imagens de um ecrã gigante de um concerto sem som

Joguei às escondidas numa estrada plantada de candeeiros saltitantes, envoltos num nevoeiro azul. Ao fundo projectavam-se imagens de uma humanidade sem rumo, sedentas de sangue, onde se sentia o silêncio angustiante da ausência de convicções.
Entrei numa história sem argumento, onde até o pincel se recusou a misturar as emoções. Perdi-me entre os candeeiros que corriam loucos a fugir da luz.
Chove água sem som, lágrimas incolores de um fado sem acordes, de uma guitarra sem cordas, sem vida e sem alma.

24 outubro 2003

choque de cores

Cruzaram-se duas linhas que fugiam apavoradas do pincel surrealista, em choque de cores.
Choravam o quadro que lhes pintaram no EU.

23 outubro 2003

o saltimbanco que não sabia saltar à corda

A Máscara era de Veneza e mesmo assim colou-se ao rosto. Do conjunto, apenas ficou o espanto do menino que estava à espera, olhando o longe, de um jogo de laranjas, a saltar das mãos do malabarista que não sabia saltar à corda. (o narrador, pintor de palavras, abriu parênteses para esboçar uma explicação, mas baralhou-se tanto, que não teve outra opção que a de voltar a fechar parênteses, não fosse estragar o quadro que lhe fugia dos olhos.)

22 outubro 2003

21 outubro 2003

quando o dia se traveste de emoções

Há um Pierrot a saltitar em passos de Cossaco a querer fugir do quadro.Veste cores de Girafa, travestido de Arlequim.

20 outubro 2003

ilusões

As ilusões não são mais do que imagens que projectamos no caminho que constroi a nossa própria realidade. O sonho descobre-se entre o corpo e a sombra, onde só os nossos olhos guardam as cores com que pintamos o universo.

17 outubro 2003

cumplicidades

Já não tenho idade para andar a descobrir palavras, e de me admirar com a tonalidade e a intensidade da luz de um amanhecer de primavera em mês de Outono. Mas as palavras fundem-se em sentimentos que amadurecem a vivência, que se constrói segundo a segundo numa caminhada pelo desconhecido.
As palavras que me envolvem no Espanto, misturam-se entre conceitos estereotipados que se saboreiam em Serenidade.
A essência do mistério da redescoberta do significado das palavras está na degustação do conceito e na convicção que se forma através da vivência e da atitude.
Sem querer limitar outras interpretações, não tenho duvidas que a CUMPLICIDADE é um estado de alma que sintetiza e colora o AMOR.É como um quadro!
A relação que o quadro tem com o artista é intensa e fruto de múltiplos sentidos e sentimentos que só se completa com a assinatura da obra. O Amor é um quadro que se assina em jeito de CUMPLICIDADE.A CUMPLICIDADE é o elo de ligação que cria a magia do AMOR.

16 outubro 2003

começar

Hoje senti uma enorme Liberdade. Entrou ao de leve, como que envergonhada no meu espírito.
Apareceu desfocada e lentamente foi-se apoderando dos sentidos, até ficar clara e presente, tão presente que foi possível identificar e dar-lhe nome.
Momento único e intransmissível, porque resultado de um somatório de Tempo e de caminhos percorridos, fruto de inquantificáveis quedas e consequentes reinícios.
Hoje entendo o significado pleno da palavra COMEÇAR.

15 outubro 2003

a outra dimensão

Isto de ser vários ao mesmo tempo, tem o que se lhe diga. (mais uma vez o autor necessita de dar uma breve explicação, não vá o leitor considerar que este está demente, ou assumidamente esquizofrénico. Isto de ser vários ao mesmo tempo, tem a ver com as imagens que a memória produz. Em casos vários, não sabemos se o resultado da percepção é a realidade vivida, se a contada por outrem. É também verdade que o que realmente somos, é diferente do que os outros vêem, no entanto, ambas as versões existem. E depois há os artistas que são eles-próprios (quando inspirados) e o outro-próprio (quando ausente o impulso da criação). Sem querer ser confuso, acabei por o ser, pelo que aconselho o leitor, se paciência tiver, voltar ao principio e esquecer o breve esclarecimento, saltando de imediato para o paragrafo seguinte).
Andam Físicos, Filósofos e outros tantos Cientistas a tentar provar a existência de outra dimensão, para além do Espaço-Tempo.
Não sei se é Terceira, Quarta ou outra qualquer, mas a existência que percorre a minha memória é certamente uma, qualquer que seja a sua hierarquia.
Não se esforcem Cientistas do Mundo! A Outra Dimensão EXISTE! (ficou amplamente demonstrado, espero...)

14 outubro 2003

ajuda!

Alguém me ensina, como convencer um amigo, amargurado, que apesar de tudo, a Vida não é um fardo, mas sim um espaço para preencher, ao ritmo do tempo e sorrir, quando este tiver esgotado?
Preciso da vossa ajuda, porque um abraço, não foi suficiente...

13 outubro 2003

equivocos

As palavras andam por aí a dançar e a provocar uma enorme confusão.
Quando assim é, mais vale fechar os olhos, sentir os sons da música e não colocar nada na imagem…

11 outubro 2003

imaginem

Imaginem ( obrigado John Lennon),um grande estádio de futebol, tipo Maracanan, ou melhor, o maior estádio que caiba na vossa noção de espaço monumental . Coloquem um céu cinzento negro, emoldurado por nuvens de chuva, bem lá no fundo da imagem.( Aqui o autor, sentiu necessidade de se explicar, no que diz respeito à escolha do cenário. Teve intenção de colocar na imagem uma selva, tipo amazónica, mas teve receio que a noção de espaço, de grande espaço, do Homem Cosmopolita do Século XXI, ficasse limitada, já que mais facilmente reconhece a monumentalidade de uma obra sua, do que outras, de autores diversos, e ainda por cima desconhecidos )
Fiquemo-nos portanto com a dita referência pictórica.
Imaginaram?
Sim?
Continuemos então…Imaginem agora, um ser (sim, um ser vivo).
Para simplificar a reflexão e que se produza o efeito pretendido pelo autor, um ser vivo, raça: Humana, Subespécie: ingénuo, Idade: entre os 5 e 6 aos ( ou qualquer outra, não é de facto importante). Uma criança, suficientemente desalinhada no seu vestir (desculpem, falávamos de imaginação e eu entusiasmo-me sempre. A vestimenta fica ao critério de cada um que se der ao trabalho de continuar com este exercício).Agora coloquem essa mesma criança, algures nas bancadas do dito estádio.
Já está?
Coloquem-se agora no centro do campo e sentem-se.
Sim, pode ser no chão, ainda não começou a chover…( e também não é necessário ser em posição de lótus, se bem que até ajudava!)
O que conseguem ver?
Conseguem vê-la?
Quem?
A Criança!
Certamente que não!
E como a não conseguem ver, possivelmente nunca se questionarão por que é que aquela criança se encontra ali sentada e sozinha, num estádio de futebol de dimensões do tamanho de uma multidão.
Provavelmente, sentou-se ali a perguntar a Deus, porque se sente tão só!

10 outubro 2003

ciumes

Hoje limitei-me ao desenho.
As palavras aterrorizaram-se e esconderam-se na invisibilidade do sentido.
O lápis, esse, correu endiabrado entre a silhueta de dois corpos que se amam, formando uma linha única sem fim.
As cores evoluíram entre a sépia e o branco puro, em aguarela que deixou o lápis invejoso e ciumento do pincel e das cores que jamais conseguirá inventar.
O papel agradeceu a ambos e sentiu-se poema.

09 outubro 2003

o horizonte da alma

Oiço os tambores de um espaço que recordo com a saudade da ausência.
Sinto a intensidade dos ritmos e dos afectos, onde os odores, os sons e as cores se intensificam em sentimento.Saudades de uma terra onde aprendi a fundir-me com o Universo, e a sentir-me matéria, nos limites de uma espiritualidade selvagem.
Recordo um espaço sem fim, em variações ininterruptas de horizontes.
Acordo num sonho, só, sentado na selva africana, que me iniciou na visualização do horizonte da alma.
Conforto-me com a sensação de um dia ter aprendido a ver e a sentir essa linha difusa que nos limita o espaço e a forma da nossa existência.
São momentos raros que nos sinalizam os passos e as incertezas que nos moldam o carácter.

08 outubro 2003

cuidado com as histórias,ou os perigos de uma borboleta que decidiu ser protagonista

Contar uma história é preencher o imaginário que se intersecta na fantasia e no inconsciente de uma vontade.
É dar forma a um mundo que toma os seus caminhos e cresce, enquanto o narrador o manipula entre as emoções de um Existir que se esconde na sombra de uma borboleta viajante.
Quando a história chega ao fim, o contador fica a saborear a sua criação sem dar conta que nem o protagonista existe, nem ele é já o mesmo.

07 outubro 2003

decomposição do sentido

Olho o desespero de um corpo que morre e resiste no vazio de si mesmo, à decomposição do sentido.
Persiste o Passado que se confunde no Presente sem Futuro.
Visões desconexas de um mundo que o corpo alimenta intermitente.
Perdeu-se o amanhã em espasmos de um corpo sem comando à espera de um suspiro de alívio, aguardando janela de reencontro com a vida.

06 outubro 2003

formas de Ver

Quer se goste ou não de Dali, não se pode ficar indiferente à sua existência e à sua obra, para uns, surrealista, para mim, fobia delirante.
Quando lhe vejo as cores, são os olhos de falso louco que impõem a sua presença. É um olhar de canibal onírico que, no entanto fascinam.
Os seus olhos, esbugalhados de avidez, contrastam com os do Mestre que me inspira o desenho, as cores e as palavras.A diferença que detecto entre Mestre Almada Negreiros e Dali, distanciam-se na forma do VER!
Mestre Almada, desenhava poesia, Dali vomitava excrementos de ganância e egocentrismo primário.
Os olhos deste, reflectiam o EU, os do Mestre Almada, o MUNDO.

03 outubro 2003

sete cavalos brancos

Surgiram-me, em espasmos de memória, sete pequenos cavalos brancos de porcelana que me acompanharam a infância, expostos num recanto da sala, sob um pano verde oliva, cada qual com o seu movimento.
Recordei a sua evolução e as suas aparições durante os meus passos no Tempo. Vezes eram tentativas de desenho, onde me fixava na liberdade das suas crinas, voando em galope silencioso, outras, olhando as nuvens que se auto desenhavam em imagens ao som do vento, em movimentos místicos que lentamente se tornavam invisíveis de azul.
Mais tarde estilhaçaram-se na minha memória.Voltaram hoje, como animais totémicos num trote alado, a confortar saudades e sentimentos esquecidos.

02 outubro 2003

paradoxo

Sei que é um “lugar comum”, mas não resisto ao prazer dos odores da terra fecundada pela chuva.Sinto-me renascer em cores de primavera, num paradoxo outonal.

01 outubro 2003

a degustação da palavra

Perdi-me nas páginas de um livro, onde cada palavra, cada frase me soube a vinho do Porto (o sabor da terra, da uva, do sol, do suor, da alegria, do vento e a luz da paisagem em paladar que se degusta e não se quer que tenha fim). Saboreei as e retive-as numa confusão de sensações, entre a emoção e o prazer.
E assim fiquei, como que atropelado por um enorme bem-estar que me inibiu a palavra.
Hoje vivi na alma emprestada do poeta e confortei-me.

30 setembro 2003

peregrino

O dia entrou dentro de mim, como tempestade sufocante, onde o simples acto de respirar envolveu esforço e coordenação de movimentos. O existir fugiu ao instinto monótono do viver.
Os estímulos cegaram-me e comandaram-me até à exaustão.
Procurei o silêncio, como quem tenta, em desespero agarrar uma bóia de salvação, mas nem esses gritos de naufrago me devolveram auxilio. Senti-me embrulhado em onda gigante, onde o sentido deixou de existir.
As cores insistiram no cinzento em tons de azul negro, e eu nem sentia forças para procurar ar e para colocar os olhos noutras cores.
Prestes a entregar-me, como quem surge do nada, oiço finalmente o mar em sons de abraço que se envolve no areal de praia deserta.A tempestade acalmou e transformo-me em palavras.
O dia terminou.
Agarrei num livro de páginas brancas e os gestos desenharam palavras que emitiram sons de um grande suspiro.
Voltara finalmente a reencontrar-me. O Tempo transformara-se noutros ritmos e os pensamentos, envoltos em fumo, dirigiam-se para o vazio em passos de peregrino e em sons de batuque, como quem invoca os espíritos.

29 setembro 2003

fusões desencontradas

Fiz e desfiz o quadro que me andava a pintar cores sem desenho.
Nasceu com impulsos cubistas, recheado de traços criados com gestos cegos que se reviam em cada ponto de fuga.
Encheram o espaço com uma guitarra, um livro, uma mesa e aroma de café cachimbo. Em névoa cinzenta estava um rosto que me olhava e se olhava. Sorriso e lágrima de uma mesma cor, entre o azul e o vermelho.
Números, poucos. Datas, algumas. As suficientes para me estragarem as sombras que revoltadas quiseram ser verdes!Foi o verde que estragou o quadro!

26 setembro 2003

aqui há gato!

Sonhei que era um gato, que dormia dentro de uma lata de tinta, cor de azul velho, manchada de amarelo (daquele amarelo que não se mistura com cor alguma…amarelo amarelo…com alguns tons de vermelho!), (tenham paciência com o autor, tem muita dificuldade em decidir-se!)
O gato, besuntado de cores, saltou para dentro de um quadro enorme de MIRÓ e rebolou-se, espreguiçou-se em enorme satisfação de liberdade criativa.
Acordei sobressaltado, mas reconheci um enorme sorriso escondido na alma.
Dei comigo a pedir desculpas ao artista, quase em confissão religiosa “ …mas que culpa tenho eu, de coabitar com um gato que me salta do sonho…”

25 setembro 2003

cores perdidas

Tenho pena dos dias em que perco a capacidade de me espantar.
A culpa é certamente minha, mas não consigo insultar-me por perder a sensibilidade de descodificar os sinais que andaram a esbarrar na minha indiferença. Há dias assim. Esqueci-me de afiar o lápis e de lavar os pincéis. Mas a paleta está lá cheia de cores que não vou mais utilizar.

24 setembro 2003

a máscara

Há mascaras de várias cores, para vários momentos e ocasiões.
Todas elas enfermam de serem sombras que filtram a expressão e o sentimento, mas nunca o olhar.
Tenho a tendência de, ao acordar, como quem coloca os óculos para focalizar a existência que o rodeia, de me encobrir com uma máscara e andar com ela hora após hora.
Triste hábito de quem se procura e coloca os olhos no chão com medo de fixar as cores que o dia lhe oferece. É uma espécie de cobardia de quem se sente bem na escuridão, porque aí não tem necessidade de focalizar o olhar. Mais do que uma defesa, é uma fuga. A máscara é o peso da fantasia que nos alivia da angústia de não saber o que fazer, tal é o estado de desorientação que nos imprime o dia.
O sentimento de fuga adensa-se com o cansaço, é verdade, mas também é verdade que a fuga não nos leva a lugar nenhum, nem sequer nos serve de consolo.
Isto tudo, para chegar à conclusão de não saber se o que escrevo, o que pinto ou o que sonho, sou eu, ou os olhos da máscara que se me cola ao rosto.

23 setembro 2003

vertigem

Sou impelido para a fantasia e atropelo-me entre os vazios que me preenchem o sonho.
Perco-me na cegueira do reencontro com as certezas que nunca tive e faltam-me as forças para me erguer e caminhar pelo Mundo.
Reflexos de espelho que não me olha e que recusa o sorriso.
Ritmos que se esvaziam, como quem sente a agonia do Mundo a girar em vertigem.

22 setembro 2003

labirintos

As palavras que me envolvem o Eu começam a incomodar-me.
Criam uma teia de labirintos que se erguem como muros.
Prendem o olhar e asfixiam-me no enredo que a Vida me destinou.

19 setembro 2003

um pedaço de universo

Pintei uma flor que se reflectia em sombra multicolor.
Era uma flor alegre que sorria a felicidade de ser um pedaço do Universo.
É impossível imaginar o Universo sem aquela flor, que cheira a rosa e a alecrim.

18 setembro 2003

erro de cálculo

Quando o que pensas não cabe no desenho, pinta reticências e verás a forma em que se transforma o sonho.
"Conclusão lógica de um matemático poeta: é preciso três pontos para desenhar um sonho!”
Foi nesse instante que o matemático, na sua lógica de poeta, sentiu pena dos povos que não têm escrita para desenhar os sonhos…
Coitados dos povos que precisam de escrita para fixar o sonho, pensou o filósofo do povo que não desenha palavras…

17 setembro 2003

monólogo de um anjo

Olhei uma árvore que me disse: abraça-me!
Olhei uma gaivota que me disse: acolhe-me!
Olhei um homem que me disse: afasta-te!
Abracei o homem, senti-me árvore e voei!

16 setembro 2003

o livro que voava

Olhei o céu negro da noite.Pintei-o com as páginas brancas de um livro que voava de mão em mão. Desenhei-lhe as palavras de um pensamento e imaginei-lhe uma história.O livro passeou-se de alma em alma à procura de pensamentos de outros que pintavam o céu.Vidas depois o livro regressou às mãos de quem o largou a voar. Vinha recheado de páginas, de histórias e de sentimentos.Nesse dia não houve noite…

15 setembro 2003

tela

Acordei a rever as vidas que me cruzaram os caminhos.
Revi sobretudo paisagens, humanas umas, familiares, outras, de afectos muitas.
Senti calor, como quem pega o cachimbo prestes a terminar a cumplicidade com o fumador.
No fumo e no aroma ficaram as recordações.
São estes pequenos instantes que nos recolocam na Vida, sem receio de olhar para trás. Há infinitas imagens que nos moldaram a alma e os olhos.
Os nossos caminhos estão plantados de sentimentos e de emoções que se regam com a luz do nosso olhar.
Por isso quando acordamos e abrimos o Ver, damos conta da enorme tela branca que o dia nos oferece para pintar.

12 setembro 2003

palavra evaporada ao som do Jaz

Procuro uma palavra.
Uma única palavra que transmita a revolta que engulo em sons de saxofone numa noite escura, frente ao mar agitado.
Desenho na areia palavras e imagem sem luz.
Sei o que o desenho me diz, mas ninguém o vê.
O mar apagou a palavra, levou-a para longe, transformada em espuma que se evapora na luz da manhã.
Procuro a palavra que me contorna a alma, uma única palavra que desenhe todo o peso da minha solidão!

11 setembro 2003

terrorismo da indiferença

Hoje, 11 de Setembro, ano dois (*) do Século XXI (2003), morreram 3000 pessoas vítimas do TERRORISMO DA INDIFERENÇA.Morreram, sem rosto, sem nome, sem MEMORIAL!Amanhã, morrerão mais 3000, que caem uma a uma, sem grito, sem lágrima, Guerrilheiros sem nome, sem farda, mortos em batalha de sobrevivência.
Olhos esquecidos, almas pedidas mortas pela humanidade!

(*)Nota: O autor, não resistiu, neste pequeno texto de desabafo a que o seu inconsciente se permitisse a fixar na palavra alguns laivos de futurismo. Resignou-se aos senhores do Mundo e acreditou que mais tarde ou mais cedo, a hipocrisia do poder, transformada em arrogância, venha a assumir-se como senhora do Tempo. A tragédia que assolou os ditos senhores em 2001, à semelhança de tempos idos, irão, na óptica resignada do autor, levar a ajustamentos do calendário, que nos rege a alma. Assim escreveu ano DOIS do século XXI, para evitar ter que, certamente muito em breve, rever o pequeno texto, que lhe surgiu em forma de grito. Aqui fica portanto o esclarecimento, aos olhos de quem lê, que não foi erro de cálculo, mas uma, tropelia do inconsciente de quem também desenha com palavras.

09 setembro 2003

sem máscara

O que o poeta desenha com os olhos, não é mais do que o instinto que lhe vai no gesto.
É como uma pedra, lançada ao Rio.
A água desdobra-se em círculos a desenhar o momento do reencontro.
A imagem é o reflexo do instante que surgiu sem introspecção e sem mascara.
É reflexo de luzes que vem do nada.

08 setembro 2003

exercito sem nome

Quando mergulho na realidade, sinto a revolta de ter andado fugido no sonho e não ter agido, em sons de luta e juntar-me aos guerrilheiros da Humanidade.
Eles andam por aí fardados em exercito sem nome a distribuir afectos e a criar o Homem Novo.

04 setembro 2003

luz

Ah, como é bom acordar com o sorriso das cores, sem o peso da densidade interrogativa da tempestade, que ofusca o desenho inibido de dançar na tela.

03 setembro 2003

árvore invertida

Sonhei com um “embondeiro”, aquela árvore misteriosa e disforme que salpica a paisagem africana.
Quis ser um dos ramos que absorve a atmosfera densa, cheia de silêncios e perguntas sem resposta.Sonhei com um “ embondeiro” que se transformou numa Cruz que se envolve na dor e nas lágrimas de sangue que fotografam a Humanidade com a luz e os gritos de trovoada.
A imagem que o sonho me deu, foi uma árvore invertida de raízes a sangrar, viradas para o céu.
O quadro que pintei, fixou uma imensa savana, em tons de toranja vermelha polvilhada de cruzes em oração de desespero incontido.

02 setembro 2003

o carrasco das cores

As cores não mudam. A imagem fixou-se no quadro, que transpira tédio e aborrecimento.A culpa é de quem aprisionou as cores no quadro em tons de sofrimento.

01 setembro 2003

boleia

Mergulhei dentro de mim, envolvi-me em sons de musica e fugi do Mundo.Andei por aí de boleia com Fernão Capelo Gaivota.

29 agosto 2003

Entre a sombra e o traço

Dei comigo a desenhar uma rosa.
Não lhe consegui imaginar vaso nem cor.
No desenho cresceu um rosto que envolveu a flor e desfez-se em perfume.
A imagem do desenho não era minha. Em mim apenas ficou a emoção de me espantar com a viagem que aquela rosa percorreu até se transformar em desenho.
Olhei o rosto entre a sombra e o traço que o escondia…
Agarrei no pincel e envolvi-o em sons de guitarra que chora e se espanta com os ritmos da Vida e dei lhe cor de aguarela.
Na verdade nem o desenho nem as palavras são meus.
Meu é só o calor que ficou entre a cor e os sons de uma melodia que ecoou sem convite.

28 agosto 2003

Grito

Hoje as palavras ficaram engasgadas em forma de grito.
Perderam o sentido e andam por aí envergonhadas de Dor, como que sepultadas em lágrima retida…

26 agosto 2003

Passeio descalço pelo Tempo

Andei por aí, fora da escrita e do poema.
Misturei-me no Tempo que se consome e respira.
Ausentei-me dos sons e da imagem.
Vivi os passos descalço, assim tal qual, sem pinceladas de sonho.

22 agosto 2003

O quadro sem cor

Hoje dei comigo a pintar quadro sem cor.Prefiro o desenho. As cores estão demasiado escuras e densas para que o quadro tome forma de música.

21 agosto 2003

Às escondidas

A solidão é um estado de insatisfação, um isolamento do sentir.
É a angústia de não se saber viver o presente.
Os sons da vida estão aí mas nas não os entendemos.
Absorvemos toda a luz no Eu que se recusa ver o Amanhã.
É um processo doloroso que nos auto retira a esperança de pintarmos as nossas cores.
O mundo está aí e só vemos o sonho e a ilusão que nos corrói.
Quando isto nos acontece, e nos apercebemos que andamos a jogar ás escondidas no nosso próprio caminho, só nos resta sorrir e assim, o hoje é já amanhã!

20 agosto 2003

A Humanidade está lá fora a matar o Filho que se fez Homem

Morreu um homem chamado Sérgio que se passeava pela Humanidade.
Não sei qual a diferença entre a morte deste homem e uma morte de qualquer outro, seja ele criança faminta, desesperado sem liberdade ou de outra qualquer condição ou sem condição alguma.Este chamava-se Sérgio, era de todos nós, e passeava-se pela Humanidade.
Não sei o que leva outro homem a matar por ódio, vingança, desespero ou outro tipo qualquer de sentimento.
Este, que se chamava Sérgio dedicava-se aos outros homens.
Não foi o primeiro nem será o último e esta certeza, amargura-me e silencia-me na revolta contida, com grito sem som.
Ninguém ouve o grito de desespero que me vai na alma, porque cada um grita também a lágrima cinzenta de quem chora a Humanidade.
Não foi o Sérgio, de árvore Vieira de Melo, que morreu.
Foi o verbo Dar que ficou encolhido, qual coelho na sua toca à espera que o caçador deixe de fazer ruído e se afaste.
A Humanidade está lá fora. Chora!Cada lágrima é uma Vida que se extingue na incompreensão de se ser Homem.
A Humanidade está lá fora de olhos postos no vazio.
O filho que se fez Homem morreu.
Todos os dias, morre o filho que se fez Homem.
A Humanidade está lá fora a matar o Filho que se fez Homem.
Choro a revolta de fazer número para a Humanidade.
Eu estou lá fora, enroscado na tristeza de sentir dentro de mim todas as lágrimas dos que fogem da Humanidade.
Estejas onde estiveres, Sérgio, de nome Vieira de Melo, recebe o meu abraço, e enxuga as minhas lágrimas.

19 agosto 2003

Para ti que estás triste

Estou perdido no meio da Tua e da minha tristeza.
Perdido nos fantasmas que te ensurdecem a alma e a solidão.
Procuro o gesto que te angustia o sentimento de olhares o vazio e não te encontrares se não no refugio das palavras que escondem o contorno da Alma.
Gostava de te pintar as cores do reflexo, em tons de alegria, mas só consigo ouvir o vento. Talvez amanhã, sim talvez amanhã consiga pintar-te uma gaivota colorida em tons de arco-íris e poder dizer-te que para reencontrares o sorriso, basta olhar o poema da Vida que corre ao nosso lado e que insistimos em não ver, por só conseguirmos sentir a dor que o coração vai tecendo, em teia que nos cega o olhar.
Mas hoje não.
Hoje sinto-me tambem eu preso nos caminhos que não consigo olhar se não com o coração.

18 agosto 2003

Tempestade

Hoje vi a morte, numa tempestade de reflexos.
O que nos separa da Vida e da Morte é uma ínfima fracção de destino a que só damos valor no momento em que o turbilhão da existência nos foge do olhar.
Renascemos todos os dias a cada fracção que o destino nos concede.
Somos um ponto de um caminho que julgamos dirigir, mas que se constrói em Jogo de dados. Hoje, desenho palavras porque os dados olharam para mim e eu sinto-me impotente e esmagado pela incerteza do Existir.

13 agosto 2003

A fuga do espelho

Quando nada te toca e te sentes somente Tempo, algo morreu.
Perdeu-se o sentido e a luz andou por aí à procura de espelho.
O espelho fugiu.
Talvez amanhã me reencontre, mas o tempo levou a admiração do Existir.

12 agosto 2003

Uma palavra cheia de Universo

Sento-me a ouvir o silêncio e os sons do sonho.
Os ventos dos moinhos continuam a trazer-me perguntas que me angustiam e me deixam o olhar vazio.
- Porque usas sempre as mesmas palavras?
Há décadas que te embrulhas pelos sentidos e te repetes em quimeras.
Será que não crescestes ou as palavras que desenhavas, eras tu que te ouvias no Hoje?
O lápis parou o desenho, e a palavra ficou ali a pairar cheia de Universo.

11 agosto 2003

O Eco

Sentado na praia, inspiro todo o Mar que o olhar, sôfrego, engole.
O Mar que me coube em sorte, anda de um lado para o outro dentro de mim, com sons infinitos.
Todo o Mar que inspirei, transforma-se em ecos e em perguntas sem resposta.
- Quem és tu? Pergunta-me o eco.
- Jeremias. Jeremias Almaro.
- Que fazes na praia a inspirar-me com o olhar?
- Sou poeta-pintor, nas horas em que Me vivo!
O eco apagou-se, o Mar fugiu e voltou a ser imagem em azuis de outra cor.

09 agosto 2003

Todas as palavras rimam

Todas as palavras rimam, porque traduzem sentimento. Traduzem o desenho da nossa alma. E o desenho, tenha ele cor ou não é na sua essência um Poema de vida.

08 agosto 2003

Dúvida

Diz-me, Papá, porque é que Deus se esquece de Nós?
Porque dizes isso?
Porque o Luís morreu, sabes quem é o Luís, não sabes?
Sim, Filhote, sei que era um grande amigo teu.
Sinto-me tão triste. ELE não me ouviu, e eu falei com ELE todos os dias!
Sabes Filhote, ELE não cuida de nós individualmente, para ELE nós somos um todo, e o Todo que nós somos é um pedacito DELE.
É como o nosso coração. Ele bate e leva o sangue a todo o nosso corpo. Tem essa função. Também ele é um pedacito do Nosso Corpo. Nós não falamos com ele, nem ele fala connosco, mas está ali a bater sem descanso, para que possas viver. Ele bate, e não estás à espera que ele te pergunte se pode bater. Está ali, e isso te basta.
Também nós somos um pedacito DELE. Também nós, sabendo que somos parte dele o não questionamos. O que devemos questionar, é o que Ele quer de nós, e isso meu filhote não te sei responder, e a isso meu amor querido chamamos FÉ.
Papá, sinto-me tão pequeno. Dá-me um abraço forte. Quando me abraças é tudo tão Bonito!

07 agosto 2003

Quando nos pomos a revisitar os sentimentos

A olhar o mar e a sentir o Sol a penetrar o vazio, revisitei sentimentos.
Encontrei um conjunto de palavras dispersas recheadas de afectos.
Dei comigo a conjugar o verbo Dar.
Não posso negar que senti uma enorme solidão...

06 agosto 2003

Conjugar o verbo Existir

Procuro o verbo existir, e confundo-me nas conjugações.
O desenho toma forma, e dimensão, mas porquê e para quê?
Qual o sentido?
Qual a função?
Será que só o conjunto faz sentido?
Procuro na paisagem, de olhos postos em oração e não encontro cor.
Só oiço o mar, só vejo a gaivota, mas não sei para onde vão.

05 agosto 2003

À procura da nova descoberta

Hoje fugi com aquela certeza de alguém que se reencontra na Palavra do EU.
Fugi por aí à procura da Nova-Descoberta!
Por isso fui por aí (que me perdoe o Régio e o Cântico Negro).
Fui à procura do meu reflexo, verticalizado na minha própria imagem.
Por isso fui ao encontro da Multidão, à espera que os Olhos da Cidade me vissem.
Fui, e na ida até os passos eram Meus.

04 agosto 2003

As palavras que me desenham o EU

Estou sentado, rodeado de recordações e de páginas escritas com palavras que me desenham o EU.
Os traços variam entre a cor e o vazio.
Busco o sentido do traço como quem vê o desenho de uma criança.
No desenho está lá tudo; a casa, a árvore, o pai, a mãe, o irmão, a professora, o Sol, os pássaros e as nuvens.
Está tudo lá, falta a perspectiva.
A minha vida é isso mesmo!
Desenho sem ponto de fuga.
Está tudo lá, falta a poesia!

03 agosto 2003

Cegueira

A Vida é um conjunto de intersecções de ciclos “ Vida-Morte”, e este conjunto é UNO. O resto do Todo é uma repetição de ciclos que se atraem e repelem, que se amam e se odeiam. Por isso estamos condenados a instantes sucessivos de visão e de cegueira, por isso quando Vemos doem-nos os Olhos e queremos fecha-los e quando os fechamos, caímos e querermos Ver…

02 agosto 2003

A fuga do desenho

Hoje o desenho, fugiu-me.
Ando desencontrado com a cor.
É estranha esta sensação de vazio que nos enche de angústia...
Andei por aí a pintar palavras no ar.
De que nos vale a Vida se não a olharmos e a sorrimos em acto de aceitação do imprevisto?
A Vida entra-me pelos olhos e fica a martelar-me com imagens coloridas e desfocadas.
Sinto-me um buraco negro no Universo da Humanidade!!!
Tudo o que me entra na Alma, filtra-se e perde a LUZ e o brilho!
A luz anda a saltar de palavra em palavra e recolhe-se no meu espírito.
Quero fugir e por isso procuro-me e ando por aí dentro de mim como bailarina em caixa de música.
Vou pôr-me à procura do Sonho, para que o tempo avance e eu não dê conta do que estou a perder.

01 agosto 2003

O contorno da Alma

Burro! Três vezes Burro!Como te podes ver ao espelho sem te pores à frente Dele?Como te podes Ver ao espelho se vestes o teu eu-próprio de um outro ele-mesmo?Tudo o que podes ver, está longe de ser o contorno da tua Alma!

31 julho 2003

Fuga

A Humanidade está lá fora!
O problema da Humanidade é que cada um sente a sua vida individualmente.
O problema é que cada um foge da Humanidade!
Quando fujo da Humanidade, perco-me na Multidão!
É impossível ouvir o vento no meio da multidão.
É preciso estarmos Sós para nos movermos na Humanidade!

30 julho 2003

Oração

A minha oração é uma permanente pergunta, e um escutar não tão permanente como desejaria.

29 julho 2003

Maldito miúdo...

Bateram à porta.
Abri. Era um miúdo com a cara suja, manchada de lágrimas secas.
- Anda comigo - disse o menino.
Levei a mão ao bolso e dei-lhe uma moeda.
O menino olhou-me angustiado.
- Anda, vem comigo! - repetiu.
Fechei-lhe a porta. Senti-me mal. A angústia dos seus olhos entrou no meu corpo.
Fui fazer um café, comi pão e fiquei mal disposto.
Devia ter ido com ele!
O que seria que ele me queria?
Tinha ar de quem se perdeu.
Estava tão aflito.
E eu, armado em burguês estúpido, dei-lhe uma moeda, para que ele se afastasse e deixasse de me incomodar. O que é certo é que ele se foi embora e deixou-me vazio e indisposto.
Senti-me a lágrima seca do mendigo.
Reabri a porta! A rua estava deserta, nem um cão, nem um carro, nem o menino, apenas rua sem fim.
Apeteceu-me outro pão. Fui comer. Senti-me ainda pior.
Deitei-me, liguei o rádio …” quem vir um rapaz de cabelo preto, olhos castanhos, calções vermelhos e camisa azul, é favor contactar para o número de telefone 33544678. O rapaz é perigoso, tendo fugido há dez anos de casa de seus pais. Dado que só agora comunicaram o seu desaparecimento é possível que já não vista as mesmas roupas…”
Desliguei o rádio e saltei da cama.
Fui à janela, desci as escadas e abri a porta. Nada!
Sim, era ele!
Sim, tinha os calções vermelhos!
Sim, a camisa azul!~~Mas o rapaz não pode ser o mesmo que me bateu à porta! Aquele que me entrou nos olhos não devia ter mais do que dez anos.
No entanto…curiosa coincidência, tinha os calções vermelhos, cabelo preto e olhos sujos.
Sim, não lhe vi os olhos!
Só lhe vi as lágrimas, e as lágrimas eram castanhas!
Tentei telefonar para o número indicado mas ninguém atendeu!
Saí de casa e fui por aí à procura do menino!
A rua continuava deserta. Era meio-dia e a luz estava cor de pôr-do-sol, e já se notava a Lua.
Teria adormecido?
Teria sonhado?
Estava a ficar louco!!
Olhei o relógio da igreja. Meio-dia e um quarto!Voltei para casa. Tive medo de andar na rua. Não podia deixar de ter medo de andar na rua ao meio dia com uma luz de pôr-do-sol!Quando era pequeno, punha-me a pintar com cores do por do sol. Sentava-me na secretária e entrava no mundo dos “ Raios-do-pôr-do-sol” e punha-me a desenhar mundos, espaços e cores. Mas estava sentado e era eu que comandava o sonho, o desenho e as imagens. Agora era diferente. Agora tinha aberto a porta e tive medo de andar nos meus sonhos de menino!
Voltei a abrir a porta.
Estava um lindo sol de meio dia, e as pessoas andavam apressadas como quem quer chegar rápido a casa para tomar um refresco de Verão e almoçar!
Devo de facto ter adormecido!
O melhor é mesmo ir tomar um bom banho para refrescar a cabeça.
Maldito miúdo.

28 julho 2003

A vida e a localização do ponto

O Ponto está no acaso.
O Ponto é o Tempo-Espaço onde o Futuro acontece no Presente.
É tudo uma consequência do Ponto, e a vida não é mais do que uma conjugação de Pontos sucessivos.
O nosso caminho é apenas a linha do Passado.
O Ponto, é onde se cruza a dimensão existencial do Ser!
Quando se consegue partir deste princípio, tudo nos parece belo.
Se seguirmos a perspectiva do Ponto e olharmos a Vida, não deixamos de encontrar todos os Pontos comuns que criaram os instantes.
O nosso próprio nascimento, não passou de um acaso.
Se assim não fosse, não seriam necessários um batalhão de seres minusculos a precipitarem-se, em óvulo feminino!
Bastaria UM, directo e incisivo!
Mas não!
É preciso a intersecção de inúmeros acasos, para que o Ponto exista!
No meio de tantos Pontos, cada um contém o seu ponto de vista.
Cada um é ponto de partida e de chegada, mas em cada instante, apenas um nos pertence, e esse é sempre o mais Belo!

27 julho 2003

A palavra nova...

Tenho andado a querer ser as palavras de ontem, as apalavras que Me eram o EU.
Hoje, sinto que posso criar a palavra Nova, sem angustia e sem imitação de sons.
O importante já não são os caminhos!
O caminho está tomado!Agora o urgente é dar cores ao Caminho!
É bom saborear a verdade, é como beber um copo de água sem sede!
A água fica no palato, sem sabor, sem meio termo.
Nua e crua!

26 julho 2003

As viagens valem pelo sonho

Sonho cada rosto que me envolve, cada vida que me acompanha.
Em cada uma desenho pinceladas de realidade, mas a maior parte delas são traços, rostos que me emprestam o seu corpo, onde lhes entrelaço uma vida própria.
Parto dos rostos para o sonho e do sonho para a realidade.A ponte está nos meus olhos.
A ponte é a vivencia no meu próprio sonho.
É como pintar uma paisagem cheia de luz num dia de nevoeiro.
Como é excitante comparar o que se pintou, depois do sol entrar na visão da própria paisagem!
Quais os traços que pertencem à paisagem?
Quase nenhum!
Mas o quadro existe!
Está ali até o rasgarmos!
A paisagem também!
Aquela, e a outra por trás do nevoeiro!
Qual é a real?
Qual a mais bela?
Minha, só a que tenho nos olhos e no quadro!
A mais bela, a que andou entre um e outro e não ficou em nenhum!

25 julho 2003

O desencontro da partilha

Ao trocamos o nosso modo de ver com alguém, lançamos um olhar que quando interiorizado, se torna parte do outro. A partilha surge, quando o olhar do outro se torna sentimento, nosso e de todos! O nosso Eu-Próprio é um filtro que provoca constantes desencontros, por isso há desenho, sem traço, sem cor e sem imagem do Todo, que somos em cada um que nos toca o EU.

24 julho 2003

O desenho da palavra

Os caminhos estão aí, como quem foge da solidão de si mesmo. A direcção e o sentido convergem no ponto, que traduz o sentimento atraves da palavra. O antes e depois juntam-se no pensamento envolto em fumo de nicotina, como quem se refugia no vazio de si.

23 julho 2003

Fixar a imagem...

Insisto no caminho que os olhos me dizem. Os passos confundem-se com a intersecção dos pontos que me localizam no presente. Cada avanço, recuo ou hesitação desenha o destino e a transformação do universo. O universo transforma-se em cada intersecção dos pontos de cada caminhante. Somos assim responsáveis pelo pulsar do universo, mas o melhor é nem pensar nisso...fechar os olhos e reinventar o desenho de nós proprios, com lápis e borracha, não vá o desenho fixar a imagem distorcida do sentimento de se ser poeta sem papel para registar o acto ...

22 julho 2003

O reino do HOMOSAPIENS-SAPIENS do século XXI

Estou de facto a ficar velho, não tanto um velho do Restelo, mas sim um resistente quase militante ás novas formas de comunicação, que invadem o quotidiano poético de quem gosta de ver o que as palavras nos dizem, com imagens que nos retiram a gustação de reinventarmos a imagem através dos sentidos que as palavras escritas nos permitem, pintando as nossas próprias cores. Sim eu sei que o período é longo, confuso, com várias leituras, com várias perspectivas, com sentido ou sem sentido algum, mas traduz o que uma fotografia, ou uma palavra amputada ( estilo agora é ke é, ou kando mandei aKilo), são incapazes de revelar.Isto para dizer que ultimamente recebo quantidades imensuráveis de e-mails com fotografias de todos os feitios possíveis e impossíveis , das mais diversas proveniências (amigos, conhecidos, desconhecidos e entes queridos), que me tem deixado gradualmente, velho, rabugento e amargurado.
Eu, que sou um dislexo nato e que durante toda a minha sofrida instrução tive que estender a mão para solenemente, de olhos baixos, sentir a dor de uma reguada por cada palavra que escrevia ao sabor do som dela mesma ( cosinha, lasso, caza, baloisso, etc, etc), sou invadido por trejeitos linguísticos que leio e releio à procura do som que emitem para lhes tomar o sentido, quase me apetece desabafar com um "porra que não aguento tanto ruído !"Mas pior que as palavras sonoras, são mesmo as imagens. Não tanto a imagem em sim, mas o acto de comunicar com imagens. Limita-me o sonho, (mesmo que elas próprias já traduzam o sonho de alguém), limita-me o acto de desenhar o ver , pois sou condicionado, como quem entra num túnel e só espera ver uma luzinha lá bem à frente no meio da escuridão .
Desculpem o desabafo, escrito e sentido de uma só vez, assim tal qual saiu do sonho de pensar as palavras, que nos traduzem o sentimento, impulso cada vez mais raro neste HOMOSAPIENS-SAPIENS do século XXI.

não uso tempos, nem agendas ou instrumentos outros que meçam pedaços do existir. é jeito meu. por isso passar de um ano para o outro é cousa...