18 dezembro 2003

à chuva

Os dias passam lentos com cheiros de tristeza e artefactos de solidão.
Sobram-me as cores que ficam retidas no pincel, mas que iluminam o VER de quem se sente bem à chuva, como quem chora com os olhos DELE!

11 dezembro 2003

sem resposta

Há reflexos de Deus em todas as perguntas que me intersectam o espírito e para as quais não encontro resposta.

09 dezembro 2003

silêncios

As palavras perdem-se no filtro da disponibilidade. Ficam como que arquivadas à espera de uso para nascerem em composição.
O tempo que não se inventa, actua como filtro de silêncios e de transparências do poema que procura desesperadamente a cor...

05 dezembro 2003

a rapariga de olhos tristes que carregava poesia

Passeava-me sem direcção, de olhos recolhidos na calçada, protegido do cinzento da chuva, quando, sobressaltado me interromperam os pensamentos vagos que me entretiam o Ver.
“Posso fazer uma pergunta?”
Invadido por uma silhueta de olhos tristes, pausei o Tempo de resposta no intuito de me recolocar no movimento quotidiano que borbulhava no redor e saiu-me resposta receosa.
“Pode, claro que pode!”
“ Gosta de literatura?”Que raio de pergunta, pensei.
“De alguma”, respondi em impulso incomodado.
Fixei o rosto parado que me inquiria e insultei-me. “ Mais um louco! Continuo a atrair os loucos desta terra! Pareço um íman descontrolado que atrai a demência! Tenho que me revisitar no Espelho! Por que raio vem todos ter comigo?”
Não tinha ainda terminado os fluxos de introspecção íntima, quando fui atropelado com mais uma pergunta.
“ E poesia?”
É demais, gesticulei interiormente.
“ Poesia? Não, poesia não!”
Estúpido! Anormal! Cobarde! Foi o insulto que me auto-flagiou.
“ O Senhor, não depende da poesia?
Não! Na verdade não estava nos meus dias e não fui capaz de resposta. Acelerei os passos, que já andavam meio perdidos e fugi, evitando cruzar olhares.
A vontade impelia-me para voltar atrás e continuar a conversa e dar-lhe outro rumo. Senti-me personagem de Jostein Gaarder do livro a Rapariga das laranjas.
Mas a minha rapariga da “poesia de olhos tristes” desaparecera definitivamente, escondida na multidão que subia-descia o Chiado.
Queria dizer-lhe que não, que não dependia da poesia, que dependia da água, do sol, do trabalho, mas que no fundo, no fundo era a poesia que me orientava o VER. Era a poesia que me pintava as cores da alma.
Revisitei o local na esperança de reencontrar a rapariga mas o momento, o instante, o poema estava irremediavelmente perdido.Sobejaram as palavras não ditas, restou o sonho de um reencontro, restou a poesia de uns olhos tristes que me retirou dos passos da multidão.

02 dezembro 2003

quando as árvores se transformam em vitrais que dançam com o vento.

Percorri riachos, bordados a musgo e a cogumelos tristes, escondido do Tempo.
Passeei-me em busca de tonalidades, como quem percorre a estrada do Destino, atento aos sons, aos odores e aos verdes repintados de amarelo-vermelho.
Sentei-me a contemplar as árvores transformadas em velas de altar sem tecto que me sorriam e me impediam os passos.
Só quando a luz estremeceu em sombra, e apagou os vitrais que dançavam com o vento, retomei o Tempo, que aguardava por mim junto ao asfalto.

não uso tempos, nem agendas ou instrumentos outros que meçam pedaços do existir. é jeito meu. por isso passar de um ano para o outro é cousa...