30 junho 2005

de papel...no azul

Vagueio o vazio,
O mesmo.
O sempre que me navega,
vagabundo,
o que me habita no destempo do Eu que me cega…
Marco sem bússola as pegadas
que gravo,
grave,
no Mar…

É esse o desenho do meu vazio…

Os passos no azul…

Os pássaros?
De papel?
Presos?
No fio?

Não,
Não há pássaros azuis-de-mar e eu sou pássaro-onda,
branco-espuma,
nuvem,
que vagueio no vazio,
nos passos,
sem compasso,
perdido no tempo...

No pêndulo?
No templo?

Gravo as pegadas,
uma
a
uma em voo alado,
sem destino.

Não procuro,
ando,
vazio,
num círculo,
longe de mim...

De TI?

Sou onda-eco,
que desenha passos,
no jardim…

29 junho 2005

(des)humanidades

pinto, de lápis e cores de água.
suave ,
não vá o lápis revoltar-se.
os olhos do lápis partem-se em lágrimas se lhe transmito a dor disforme que me salta do ver.
aguarelo-me inteiro,
dessalinado,
em ossadas-andantes-na-negritude-do-sangue-fome.
não tenho ódios,
nem raivas,
nem palavras,
nem gritos,
sou indignação.
por inteiro.
afiado, como o lápis que me escreve,
sem poesia nem perdão.
pinto,
suave,
com o cuspo da ilusão.

parem o tempo!
já!
ah se desse, parava-o eu,

a cada segundo morre uma criança sem (a)deus .

parem o tempo já.
agora!

para que não morra a criança que ainda não nasceu…

já não grito.
já não choro.
sangro sal.
uivo ,

sou animal.

28 junho 2005

desencontros

Encontrei nuvem que me contou coisas que só o céu sabe. Disse-me assim sem vergonha e com escárnio que nos olha um a um e se põe a imaginar um desenho para cada qual. Disse (faladora dos diabos esta nuvem…) que me viu palhaço quando eu ainda era só coisa pequena, mas que agora estava disforme…
Estou à espera que te desenhes, sublinhou num sussurro arrogante e sem sorrisos.
Vou falar com outra nuvem…esta não tem imaginação nenhuma.

25 junho 2005

irrequietudes de um caminho

Sempre que me aproximo do horizonte ele inquieta-se e transforma-se em montanha.
Só na distância da planura sinto o infinito de uma linha que me acalma em serenidades longínquas e me sinto em mim...
Quando me aproximo, quando saio de mim, tudo se agiganta em perguntas que se perdem sem resposta ...

In “ apontamentos para um manual da serenidade” ou como só te deves aproximar do horizonte se estiveres preparado para a subida, porque o teu horizonte, a linha que procuras, encontra-se para de lá da ilusão ...

24 junho 2005

um só nome...o nosso

Desenho o teu corpo de linha só, dos cabelos nasce a linha que te percorre os traços de mulher.
Tens um só traço,
um só nome,
Beijo-te os seios, em vento-seda-de-carícia,
sorris…
é como beijar a felicidade…

23 junho 2005

(em) sombra

Sento-me no Sol,
ensandecido,
queimado no desmim,
gota de um nada,
ferido
na
asa,
quebrada
num alar esquecido,
do fim…
Vou
no
que
sou
em voo,
sem
ali…
Ah, fosse eu Só,
sombra-oculta
na penumbra
de mim
e era vento-vela
no mar,
solto
do além
do aqui…

22 junho 2005

dimensões

O infinito,
tem,
entre outros,
dois tamanhos e um é MAIOR que o outro…
Não há infinito como o de uma criança…
Quando crescemos, ele encolhe, mingua, nos filtros que usamos no abuso de o olharmos por dentro, o nosso infinito passa a ter o tamanho do nosso “por dentro”…
Só o infinito de uma criança salta dos olhos…e é esse salto que o transforma em ENORME

21 junho 2005

na corda de um peão


Desenhei a fantasia,
numa flor…
Pintei-a de cor,
de uma cor…

Uma.

Só.

Musiquei-me a ouvi-la,
(nos
pingos
que pingam
o
tempo,
e
as
esperanças
),
todas as histórias,
que
ela
tinha,
nas
lembranças,
mais
os segredos
que
não
dizia
a
quem não lhe soubesse
a
dor,,,
Eu,
sabia,
desenhei
a
fantasia
num dia
de
sombras-vazias,
nas
curvas
de
um
peão
que girava
sem
asas,
nas linhas
da minha vida.

17 junho 2005

história mal contada, ou como nem todas as histórias servem a uma criança

Tentei contar a uma criança que o céu, durante o dia tem mil e uma estrelas, não uma.
"Nem todas tinham nome, era certo, que a que se via, escondia as outras e quase nos cegava quando olhada, olhos nos olhos, era também verdade, mas elas estavam ali, como anjos a brilhar"…
Duvidou, o menino que me ouvia, com tanto desacreditar que tive que arregaçar as mangas, pegar em escadote e uma por uma , até mil, repintar todas as estrelas-anjo que se envergonhavam nos azuis claros do dia.
Não sei se foi por causa do Sol ter derretido todo o meu trabalho, ou por não ter escolhido os amarelos-brilho certos, o certo certo é que ouvi com todo o desdém , Isso é batota! Disse-o assim sem mais, com os dentes todos, poucos, mas todos, num sorriso de troça…
Não é nada batota, insisti com a imaginação toda aflita…
Voltei a subir a escada e furei o céu em mil e uma alfinetada a pedir-quase-reza, às sortes que acertasse em cada uma das estrelas que se divertiam escondidas de mim.
E agora? Perguntei sem abrir os olhos, tal era o meu desacreditar…
Estragas-te o céu todo! Vou dizer à minha Mãe! Vai-se esvaziar todo! Estúpido!
Fiquei a vê-lo ir em corrida de medo sem olhar para o atrás …
Só reabri os olhos à noitinha.
O céu estava todo divertido, às gargalhadas de luzes…

16 junho 2005

cadastro de mim

Todos os meus átomos são de Mar, Terra e Ar…
Só um me escapa…
É esse que me leva... na lembrança do existir…

15 junho 2005

Mestre


Não nos deixaste,
ficaste inteiro no VER,
na invenção dos dias claros que se escreveram no desenho com todas as cores da HUMANIDADE…

Somos orpheus de ti

há 35 anos(*) eu era criança , tu….também…

(*) anos da morte de José Almada Negreiros

a forma de uma intimidade

Não sei em que pedaço
do espaço
que
me
abraça,
encontre a suavidade
de
uma
intimidade…
( aquela coisa estranha que nos aquece até ao (des)fim …),
se em gota de sal,
pingada num sorriso,
se em seio,
desenhado,
visto,
de mulher,
desvestida no baloiço da brisa,
ou em orvalho de rosa,
flor,
perdida,
na cor…
Não sei em que forma de lágrima,
ou em que forma,
procure…
Seja ela o que for,
molde,
pintura
risco,
escultura,
esboço,
sonho,
delírio,
loucura,
apenas nuvem,
ou amor,
que surja
do
aqui
ou
do
além…
mas que seja intima.
Sem dor…

14 junho 2005

coisas simples

O sonho mais simples de um homem, é dizer "amanhã" com um enorme sorriso no olhar...os outros são muito mais complexos (não nos cabem no corpo*)...têm por inteiro toda a emoção do Universo!


(*) o que nos cabe no corpo inclui até onde o olhar nos leva...

13 junho 2005

os passeios de uma árvore

Encontrei uma árvore que se espreguiçava em mil-braços-de-palhaço-aposentado, espécie rara, porque pastora, guardiã de pássaros-folha…
Tinha momentos de futuros e sorrisos, porque quando os seus pássaros voavam, transformava-se em nuvem.
Gostava de viajar, esta arvore-de-babel de cores muitas e mil cantares…
Descansou na minha sombra…tinha cousas para me contar…sabes, disse-me em sinceridades, já percorri o Mundo, levantada pelos meus pássaros, mas tenho saudades da Terra, estou cansada de me levarem. Perdi raízes. Sequei-me nos sonhos e nas cores de um ir que não me coube no acaso. Tenho-me sede de árvore, de sentir o vento ir com afagos de carícias de penteares. Tenho saudade de sombra, de me passear na sombra em rodares de saia bailarina ao sabor da estrela, ao ritmo da luz. Tenho saudades dos meus passos…só me passeio em sombra…
Guarda os meus voares…quero sentir as minhas folhas

Eugénio

os poetas não morrem...
vão com as aves


caro Eugénio,

Dias há em que as palavras ficam presas entre o olhar e a garganta, agrilhoadas numa dor suave que não grita mas que nos perfura a alma...Estilhaçam-se, fragmentadas em lágrimas que já não existem, porque se choram, vazias.
Dias há em que os poetas partem nas nuvens, sem palavras, só com poesia…
um abraço,

12 junho 2005

as cores que o escuro esconde

A noite levou-me nos desdormires como se todas as inquietudes se concentrassem em ebulições descontroladas do existir e só coubessem fora de mim.
Levantei-me e fui com ela à procura do escuro ...

09 junho 2005

mimicas esquecidas

A cidade-grande vestiu-se de violetas-fortes.
Parecia uma cidade a retirar o luto, com quase-sorrisos-coloridos escondidos entre muros e paredes de casas que me desconheceram os passos.
Senti-me visitante-intruso nas ruas que se esqueceram de mim…
Tentei guardar o sentir dos violetas-fortes ( com todo o brilho que uma cor nova tem, sem águas), mas estavam presos ás árvores e nem elas me falaram com mímicas de ventos…
Tenho que as percorrer mais vezes, talvez assim elas ( árvores e ruas ) se recordem de abraços e histórias antigas que trocávamos com o olhar.

08 junho 2005

07 junho 2005

os meus lápis

Hoje não desenhei, não encontrei os meus lápis de cor. Saltitaram todos, em viagem que não sei. Fazem-me falta, os lápis, porque as cores, tenho-as sempre, mesmo no escuro…principalmente no escuro. É no negro ( com ou sem sombras) que lhes dou o contorno do sentir e este só é intenso quando me cego.
Mas são os lápis que me brincam e me jogam a vida.
Os meus lápis não têm embalagem, por isso nunca os afio. Eles gostam de se empoeirar nos meus dedos ( é a nossa intimidade, os nossos sussurros, reduzidos ao mais simples, ao elemento, ao pó). A espessura do traço é com eles. Por isso gosto do desenho, ando sempre a adivinhar a forma e o peso do sentir. Todos os meus lápis me são pele por isso não ouso usar borracha...
São uma enorme responsabilidade, ter lápis que se alimentam do meu sentir. Vezes há, que me fogem e eu fico a perguntar-me se foram desenhar sozinhos a história que me descobriram nos dedos...
Quando conseguir decidir-me no nome que hei-de dar a cada um, deixo-os partir sem me interrogar…

06 junho 2005

mão

Abri a mão e tentei lembranças sobre as linhas que lhe gravaram os caminhos que a dobra.
Sorri…
Estão lá todas, as de menino e as outras.

Posso fazer o desenho!

De uma, a outra está ocupada com as cores que os olhos lhe dizem…

04 junho 2005

lentidão

Passeei-me lento entre amarelos secos…
O Tempo d e m o r o u – s e . . . agrilhoado no suor da terra... adiou-se, como que filtrado nos poros do existir.
Percorreu-me o corpo entre carícias e lembranças, prendendo-se, esquecido. Perdido na fantasia, num mundo onde se funde nas inexistências …

03 junho 2005

( re) encontros com a noite

A noite veio buscar-me!
Descolou-me suave do Eu e levou-me…
Tinha cousas para me mostrar, cousas outras, esquecidas, antigas de um menino a chorar que desencontrou os amores, quando incauto, tinha revelado aos grandes, segredos sagrados.
Diziam, soprados ,tais tesouros (mal guardados) alquimicos, que amava... ( sabemos nós que falamos da quimica da alma) , Não menina, mas flor-fada, exótica e rara que só tinha cor, no escuro das noites e que lhe contava, em assobios-de-azuis, aventuras de um menino-indio que sonhava, sozinho... Não cousas de soldados e heróis mas de bichos pequeninos que desenhavam o que sentiam, até cousas de amores…
A noite veio buscar-me e eu fiquei a ouvir o que os azuis me diziam, cousas outras que não vou contar, pois são para ouvir, só por quem entende o vento a falar…

02 junho 2005

sem dimensão

Abri um buraco,
com pá,
picareta e suor.
Fundo.
Vertical.
A perder de Tempo.
Negro.
Sem cor, nem dimensão (medível).

(muito fundo…)

Ao lado ergui até ás nuvens,
uma escada,
de corda.
Alta
Vertical,
de prumo,
mas de cor,
Trigueira (bonita, esta escada, a imitar fragmentos de Sol).
Sem dimensão.
Alta, até arranhar ( sim, claro, o céu)
ENORME!

(até ás nuvens…)

Depois,
depois subi.
Lá,
olhei para baixo.
Para o Buraco.
Visto do alto, um buraco é um buraco, plano, sem fundo...

( com a espessura de folha de papel...de arroz)

É como a Vida,
tanto faz a distancia que temos de Tempo.
Só o instante conta e se sente.
O fim perde-se da vista…

01 junho 2005

o instante de se ser um ponto

Quis desenhar uma palavra na areia da praia...
Uma única palavra que pintasse a emoção de ser um ponto do Universo.
Não encontrei palavra ( nem cor)…
Ficaram as pegadas, até ao instante da onda se espraiar,
livre…
Como o ponto…
Como o Universo…
Ficou o instante…

não uso tempos, nem agendas ou instrumentos outros que meçam pedaços do existir. é jeito meu. por isso passar de um ano para o outro é cousa...