30 outubro 2003

provavelmente haverá outras…

É com alguma imaginação que tem sido possível encarar a vida com alguma serenidade, e continua capacidade para compreender as motivações dos outros, permitindo-me a abertura de espírito suficiente, para sorrir e ver poesia, mesmo que pintada de uma enorme solidão.
Estou convencido, que só é possível manter uma relação afectiva (neste nosso novo mundo empregando de egocentrismo, e consequente egoísmo) se estivermos dispostos a Dar, sem estarmos à espera do Receber. Isto porque se esperamos retorno, mais tarde ou mais cedo, iremos perceber que ele se perdeu algures no calor de quem o recebeu e que se esquece que o amor é um conjunto de reflexos de um espelho que só existe se reflectir a imagem que lhe pomos no sonho.
A minha forma de estar na vida, baseia-se no facto de não haver conquista. Pura e simplesmente ESTOU! Sou um observador atento que se diverte com o OLHAR, sem estar a espera de agarrar e de possuir nada do que vejo, nada do que sinto. Nada é meu, tudo é da Vida! Foi a forma que encontrei, para me sentir capaz de andar pelos meus caminhos, sem demasiadas quedas. Provavelmente haverá outras…

29 outubro 2003

o horizonte amuado

Falei com um ponto, focalizado algures no horizonte, que mudo, ria-se da humanidade.
Não consigo perceber se fiquei irritado, com aquela entidade abstracta que me absorvia o olhar, ou triste com a própria humanidade. Engoli em seco e concentrei-me num quadro em tons de vermelho com gotas de amarelo escuro.
Terminada a pintura, virei o quadro para a parede e imaginei-lhe outras cores e sorri para aquele anjo mudo e surdo escondido no horizonte, que amuado fugiu com o quadro.

28 outubro 2003

história de um livro cansado

Sujei uma folha branca de palavras que desenhavam o reflexo de uma gaivota que se escondia de um gato que não gostava do Mar.
A folha, transfigurou-se em Livro, cansado de contar a história que se ocultava nas pegadas cortadas na areia da praia. As páginas, revoltadas, transformaram-se em ondas que se divertiam com o gato que olhava a gaivota que cheirava a peixe.
Nem o gato gostava do mar, nem o mar da gaivota, nem a gaivota do gato, por isso o Livro sacudiu as paginas que semearam a areia de palavras que desenharam as pegadas de um pescador que pintava ondas, em tons de branco azul.
Foi assim, que a folha, transformada em livro, passou a ter a cor dos olhos do pescador pintor que gostava do mar, do gato e da gaivota.

Pescador = Pintor, criador
Gato = criatura
Gaivota = criatura
Livro cansado = o que ensina a Amar
Pegadas cortadas na areia = sinais do criador que a criatura não vê porque não olha para trás
Onda = movimento, vidaBranco azul = branco azul

27 outubro 2003

imagens de um ecrã gigante de um concerto sem som

Joguei às escondidas numa estrada plantada de candeeiros saltitantes, envoltos num nevoeiro azul. Ao fundo projectavam-se imagens de uma humanidade sem rumo, sedentas de sangue, onde se sentia o silêncio angustiante da ausência de convicções.
Entrei numa história sem argumento, onde até o pincel se recusou a misturar as emoções. Perdi-me entre os candeeiros que corriam loucos a fugir da luz.
Chove água sem som, lágrimas incolores de um fado sem acordes, de uma guitarra sem cordas, sem vida e sem alma.

24 outubro 2003

choque de cores

Cruzaram-se duas linhas que fugiam apavoradas do pincel surrealista, em choque de cores.
Choravam o quadro que lhes pintaram no EU.

23 outubro 2003

o saltimbanco que não sabia saltar à corda

A Máscara era de Veneza e mesmo assim colou-se ao rosto. Do conjunto, apenas ficou o espanto do menino que estava à espera, olhando o longe, de um jogo de laranjas, a saltar das mãos do malabarista que não sabia saltar à corda. (o narrador, pintor de palavras, abriu parênteses para esboçar uma explicação, mas baralhou-se tanto, que não teve outra opção que a de voltar a fechar parênteses, não fosse estragar o quadro que lhe fugia dos olhos.)

22 outubro 2003

21 outubro 2003

quando o dia se traveste de emoções

Há um Pierrot a saltitar em passos de Cossaco a querer fugir do quadro.Veste cores de Girafa, travestido de Arlequim.

20 outubro 2003

ilusões

As ilusões não são mais do que imagens que projectamos no caminho que constroi a nossa própria realidade. O sonho descobre-se entre o corpo e a sombra, onde só os nossos olhos guardam as cores com que pintamos o universo.

17 outubro 2003

cumplicidades

Já não tenho idade para andar a descobrir palavras, e de me admirar com a tonalidade e a intensidade da luz de um amanhecer de primavera em mês de Outono. Mas as palavras fundem-se em sentimentos que amadurecem a vivência, que se constrói segundo a segundo numa caminhada pelo desconhecido.
As palavras que me envolvem no Espanto, misturam-se entre conceitos estereotipados que se saboreiam em Serenidade.
A essência do mistério da redescoberta do significado das palavras está na degustação do conceito e na convicção que se forma através da vivência e da atitude.
Sem querer limitar outras interpretações, não tenho duvidas que a CUMPLICIDADE é um estado de alma que sintetiza e colora o AMOR.É como um quadro!
A relação que o quadro tem com o artista é intensa e fruto de múltiplos sentidos e sentimentos que só se completa com a assinatura da obra. O Amor é um quadro que se assina em jeito de CUMPLICIDADE.A CUMPLICIDADE é o elo de ligação que cria a magia do AMOR.

16 outubro 2003

começar

Hoje senti uma enorme Liberdade. Entrou ao de leve, como que envergonhada no meu espírito.
Apareceu desfocada e lentamente foi-se apoderando dos sentidos, até ficar clara e presente, tão presente que foi possível identificar e dar-lhe nome.
Momento único e intransmissível, porque resultado de um somatório de Tempo e de caminhos percorridos, fruto de inquantificáveis quedas e consequentes reinícios.
Hoje entendo o significado pleno da palavra COMEÇAR.

15 outubro 2003

a outra dimensão

Isto de ser vários ao mesmo tempo, tem o que se lhe diga. (mais uma vez o autor necessita de dar uma breve explicação, não vá o leitor considerar que este está demente, ou assumidamente esquizofrénico. Isto de ser vários ao mesmo tempo, tem a ver com as imagens que a memória produz. Em casos vários, não sabemos se o resultado da percepção é a realidade vivida, se a contada por outrem. É também verdade que o que realmente somos, é diferente do que os outros vêem, no entanto, ambas as versões existem. E depois há os artistas que são eles-próprios (quando inspirados) e o outro-próprio (quando ausente o impulso da criação). Sem querer ser confuso, acabei por o ser, pelo que aconselho o leitor, se paciência tiver, voltar ao principio e esquecer o breve esclarecimento, saltando de imediato para o paragrafo seguinte).
Andam Físicos, Filósofos e outros tantos Cientistas a tentar provar a existência de outra dimensão, para além do Espaço-Tempo.
Não sei se é Terceira, Quarta ou outra qualquer, mas a existência que percorre a minha memória é certamente uma, qualquer que seja a sua hierarquia.
Não se esforcem Cientistas do Mundo! A Outra Dimensão EXISTE! (ficou amplamente demonstrado, espero...)

14 outubro 2003

ajuda!

Alguém me ensina, como convencer um amigo, amargurado, que apesar de tudo, a Vida não é um fardo, mas sim um espaço para preencher, ao ritmo do tempo e sorrir, quando este tiver esgotado?
Preciso da vossa ajuda, porque um abraço, não foi suficiente...

13 outubro 2003

equivocos

As palavras andam por aí a dançar e a provocar uma enorme confusão.
Quando assim é, mais vale fechar os olhos, sentir os sons da música e não colocar nada na imagem…

11 outubro 2003

imaginem

Imaginem ( obrigado John Lennon),um grande estádio de futebol, tipo Maracanan, ou melhor, o maior estádio que caiba na vossa noção de espaço monumental . Coloquem um céu cinzento negro, emoldurado por nuvens de chuva, bem lá no fundo da imagem.( Aqui o autor, sentiu necessidade de se explicar, no que diz respeito à escolha do cenário. Teve intenção de colocar na imagem uma selva, tipo amazónica, mas teve receio que a noção de espaço, de grande espaço, do Homem Cosmopolita do Século XXI, ficasse limitada, já que mais facilmente reconhece a monumentalidade de uma obra sua, do que outras, de autores diversos, e ainda por cima desconhecidos )
Fiquemo-nos portanto com a dita referência pictórica.
Imaginaram?
Sim?
Continuemos então…Imaginem agora, um ser (sim, um ser vivo).
Para simplificar a reflexão e que se produza o efeito pretendido pelo autor, um ser vivo, raça: Humana, Subespécie: ingénuo, Idade: entre os 5 e 6 aos ( ou qualquer outra, não é de facto importante). Uma criança, suficientemente desalinhada no seu vestir (desculpem, falávamos de imaginação e eu entusiasmo-me sempre. A vestimenta fica ao critério de cada um que se der ao trabalho de continuar com este exercício).Agora coloquem essa mesma criança, algures nas bancadas do dito estádio.
Já está?
Coloquem-se agora no centro do campo e sentem-se.
Sim, pode ser no chão, ainda não começou a chover…( e também não é necessário ser em posição de lótus, se bem que até ajudava!)
O que conseguem ver?
Conseguem vê-la?
Quem?
A Criança!
Certamente que não!
E como a não conseguem ver, possivelmente nunca se questionarão por que é que aquela criança se encontra ali sentada e sozinha, num estádio de futebol de dimensões do tamanho de uma multidão.
Provavelmente, sentou-se ali a perguntar a Deus, porque se sente tão só!

10 outubro 2003

ciumes

Hoje limitei-me ao desenho.
As palavras aterrorizaram-se e esconderam-se na invisibilidade do sentido.
O lápis, esse, correu endiabrado entre a silhueta de dois corpos que se amam, formando uma linha única sem fim.
As cores evoluíram entre a sépia e o branco puro, em aguarela que deixou o lápis invejoso e ciumento do pincel e das cores que jamais conseguirá inventar.
O papel agradeceu a ambos e sentiu-se poema.

09 outubro 2003

o horizonte da alma

Oiço os tambores de um espaço que recordo com a saudade da ausência.
Sinto a intensidade dos ritmos e dos afectos, onde os odores, os sons e as cores se intensificam em sentimento.Saudades de uma terra onde aprendi a fundir-me com o Universo, e a sentir-me matéria, nos limites de uma espiritualidade selvagem.
Recordo um espaço sem fim, em variações ininterruptas de horizontes.
Acordo num sonho, só, sentado na selva africana, que me iniciou na visualização do horizonte da alma.
Conforto-me com a sensação de um dia ter aprendido a ver e a sentir essa linha difusa que nos limita o espaço e a forma da nossa existência.
São momentos raros que nos sinalizam os passos e as incertezas que nos moldam o carácter.

08 outubro 2003

cuidado com as histórias,ou os perigos de uma borboleta que decidiu ser protagonista

Contar uma história é preencher o imaginário que se intersecta na fantasia e no inconsciente de uma vontade.
É dar forma a um mundo que toma os seus caminhos e cresce, enquanto o narrador o manipula entre as emoções de um Existir que se esconde na sombra de uma borboleta viajante.
Quando a história chega ao fim, o contador fica a saborear a sua criação sem dar conta que nem o protagonista existe, nem ele é já o mesmo.

07 outubro 2003

decomposição do sentido

Olho o desespero de um corpo que morre e resiste no vazio de si mesmo, à decomposição do sentido.
Persiste o Passado que se confunde no Presente sem Futuro.
Visões desconexas de um mundo que o corpo alimenta intermitente.
Perdeu-se o amanhã em espasmos de um corpo sem comando à espera de um suspiro de alívio, aguardando janela de reencontro com a vida.

06 outubro 2003

formas de Ver

Quer se goste ou não de Dali, não se pode ficar indiferente à sua existência e à sua obra, para uns, surrealista, para mim, fobia delirante.
Quando lhe vejo as cores, são os olhos de falso louco que impõem a sua presença. É um olhar de canibal onírico que, no entanto fascinam.
Os seus olhos, esbugalhados de avidez, contrastam com os do Mestre que me inspira o desenho, as cores e as palavras.A diferença que detecto entre Mestre Almada Negreiros e Dali, distanciam-se na forma do VER!
Mestre Almada, desenhava poesia, Dali vomitava excrementos de ganância e egocentrismo primário.
Os olhos deste, reflectiam o EU, os do Mestre Almada, o MUNDO.

03 outubro 2003

sete cavalos brancos

Surgiram-me, em espasmos de memória, sete pequenos cavalos brancos de porcelana que me acompanharam a infância, expostos num recanto da sala, sob um pano verde oliva, cada qual com o seu movimento.
Recordei a sua evolução e as suas aparições durante os meus passos no Tempo. Vezes eram tentativas de desenho, onde me fixava na liberdade das suas crinas, voando em galope silencioso, outras, olhando as nuvens que se auto desenhavam em imagens ao som do vento, em movimentos místicos que lentamente se tornavam invisíveis de azul.
Mais tarde estilhaçaram-se na minha memória.Voltaram hoje, como animais totémicos num trote alado, a confortar saudades e sentimentos esquecidos.

02 outubro 2003

paradoxo

Sei que é um “lugar comum”, mas não resisto ao prazer dos odores da terra fecundada pela chuva.Sinto-me renascer em cores de primavera, num paradoxo outonal.

01 outubro 2003

a degustação da palavra

Perdi-me nas páginas de um livro, onde cada palavra, cada frase me soube a vinho do Porto (o sabor da terra, da uva, do sol, do suor, da alegria, do vento e a luz da paisagem em paladar que se degusta e não se quer que tenha fim). Saboreei as e retive-as numa confusão de sensações, entre a emoção e o prazer.
E assim fiquei, como que atropelado por um enorme bem-estar que me inibiu a palavra.
Hoje vivi na alma emprestada do poeta e confortei-me.

não uso tempos, nem agendas ou instrumentos outros que meçam pedaços do existir. é jeito meu. por isso passar de um ano para o outro é cousa...