Obcecado! Estava, duvida, não havia!
Envolvera-se em angústias e em insónias, à procura das cores que lhe cabiam na sua história. Inventara-se, entregara-se, todo, aos sentidos, atento, caçador, à escuta das cores, e nada.
Cada desenho, cada quadro, cada esboço, era sistematicamente amarrotado em ritmos febris e alucinantes. Minuto a minuto, hora a hora, dia a dia, vida toda e nada, não havia meio de se rever no quadro, nas cores que lhe corriam no sentir. Fora Homem, menino, mulher, lágrima dela, papoila, até personagem. Saltimbanco, palhaço, marinheiro sem saber içar vela, e nada, não havia cores que lhe bastassem.
Os ritmos sucediam-se loucos, com as angustias a voarem em papeis de cores várias, amachucadas, humilhadas, caíam lágrima no chão, uma após outra, quase arvore-de-outono.
Já sem tintas, já sem papel, enrugava-os, desprezava-os, em pedaços de vida que abandonava, em insónias, no chão.
Cansado, levantou-se raiva e de tesoura na mão impeliu-se para cortar os seus pincéis. Parou brusco, lívido. De nada valia, eram os seus pincéis , eram pincéis-flor, renasciam!
Por fim ( há sempre um, mesmo que não seja final, mas isso já foi história, outra. Não liguem ao narrador, fala sózinho, mas façam de conta que ouvem, ele gosta.), desistiu. Arrumou os pincéis, a paleta, os óleos, e os sujos coloridos que lhe pintavam vestes e panos, e virou-se para o caminho.
Ficou parado!
Paralisado! Extasiado, com o que lhe transbordava dos olhos. Tudo o que via, pedaço-a-pedaço, papel-a-papel, esboço atrás de esboço, era simplesmente…LINDO.
Sorriu!
Estava rodeado de UNIVERSO!
17 junho 2004
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