31 outubro 2005

o nosso nome

Há ventos sem voz que nos levam o nome,
e
cores que nos trazem outros, como se o nome fosse a nossa História.
Não queria entrar em equívocos com as histórias sem rosto nem voz.
Não é o meu gosto, mas a nossa história ainda não existe no nosso nome!
Eu,
ando sempre sem nome-concluído, porque o meu nome transmuta-se no olhar de cada um…
Divirto-me com todas as histórias que escrevem no meu nome, tão diferentes são do meu sentir…
Eu sou,
todos os nomes que me inventam, mesmo que sejam história de mentir…
Por isso,
querem todos, saber sempre o nosso nome, para nos criarem um existir…
E nós,
por mais que desenhemos a nossa própria sombra, somos sempre nós, mais todos aqueles que se pintaram no nosso nome porque passamos a existir disformes em cada um que se esquece de olhar a alma que dá caminho à nossa própria história…

In “ Apontamentos para um manual da serenidade” ou como devemos saber coexistir com todos os eus que nos inventam, com a certeza de sermos sempre só um, e que a imagem que nos desenham no nome , é apenas isso, um desenho da imagem…

28 outubro 2005

perseguições

persegue-me um som de mar em tons de violino,
em forma de asa,
quase anjo.
mergulha-me afectos escondidos num búzio ,
sopra-me sonhos,
esperanças,
e
deixo-me inundar nas ondas,
nas asas,
brancas
e
sinto,
o pedaço ínfimo do universo
que sou,
gota de um nada
que vê
onde não estou...
sigo-o
vou,
(sede vital,
esta coisa de ir
),
sempre,
em continuo
em fragmento,
em número,
zero ou um
(ah! só há dois números no universo,
e só um se soma,
todos tem verso
e reverso
mas só eu não me encontro em nenhum,
perdido no espelho)…

sou o desenho,
de gaivota
que plana,
azul,
que sente o instante de ser,
apenas,
ponto sem distancia,
sem corpo,
nem luz ou chama...
(ah! ser simplesmente o acaso,
ser intersecção do destino,
e ser assim inteiro,
ar
vento
poema
vida,
é mais que desenho
é coisa quase nada,
quase tudo,
paraíso
que
canta,
e embala
como os olhos de menino
que desenha uma flor,
uma estrela,
com as cores de um sorriso),

persegue-me um som de mar em sons de violino...

27 outubro 2005

as outras cores

Papá, papá, diz-me, porque vejo esta flor azul, e todos a chamam de cores outras?
É azul a minha flor? É não é, papá? Diz-me! Diz-me! Gosto tanto dela assim, azul…
Para ti será sempre, a tua flor-azul, foi assim que ela te nasceu no olhar…
Cada um de nós tem o seu olhar, o seu reflexo, a sua cor, para cada uma das coisas que abraçam o Ver…
Que bom papá! Assim tenho sempre coisas novas para aprender…Diz-me papá, diz-me, como é a cor da tua flor?

26 outubro 2005

mutações

transformo-me!
sinto-o!
em raízes,
fundas,
de terra,
como quem agarra a queda,
de mãos fechadas,
apertadas…
ah…fosse eu apenas folha-de-árvore,
não ficava,
largava tudo
e
era nada…

25 outubro 2005

encontros

Não encontro ninguém…
O corpo está,
Vazio.
Vejo-me apenas,
Ao fundo…
Estou no caminho, entre os olhos e a alma,
A descansar os sentidos,
Estou,
Entre o aqui e o além...

24 outubro 2005

(des) orientações

A sombra de um barco, não navega.
Finge-se em transparências e na ilusão de ir com o vento…
Só a vela vai,
no diante,
Mas,
só o leme sabe o que sente a alma do navegante…

In “apontamentos para um manual da serenidade” ou como para além do vento, para além do caminho, o importante é o querer…

21 outubro 2005

feitiços-da-terra ( desenhos-da-terra)

Risco,
o desenho-da-terra,
sulcos,
soluços-de-cor, que me embaraçam, o ver,
no bailado do sol,
a renascer…
Risco,
o riso-sorriso-da-terra,
que me afaga em ondas de mar,
e
pinto, de asa-flor,
com olhos de amar,
uma tela,
em tons meus,
de aguarela,
castanha, vermelha, verde, lilás,
Amarela…
Risco,
pós-de-cor,
de giz,
cinzelado-ao-vento,
o poema que diz,
lento,
a forma que fiz,
do rio que passa,
a dançar feliz
nos cabelos-mouros de uma cigana,
enlaçados,
em flores-de-liz,
quase linda,
quase bela…
Risco,
a-cor-da-terra-que-me-leva
e
lava,
enfeitiçado,
no barco que me navega,
ao som do mar,
ao som da vela,
neste dia que me foge,
em sonho,
singelo,
alado…

19 outubro 2005

conversares

Há acordares que nos morrem no dia e na poesia
e
o que sobra são cinzentos fingidos de sombra.

Todos os dias têm cores e sentires, escusas de insistir com essa tua tristeza, foge do poema que te arrasta na melancolia, deixa que as cores se aguarelem no caminho!
Não vês tu que elas estão lá?
Esperam-te!
Não as vês tu, a dançar?
Pobre de ti se te mascaras no tu que te foge do eu…
Deixa A poesia,
e
embebeda-te do dia.
Não A escrevas,

não A sintas,
não A pintes.
VIVE-A!
Ama-A !

Ai!
Quando o Ulmeiro me abraça e se põe a sussurrar,
não sei o que faço,
não sei que diga,
entrelaço-me,
adormeço
e
esqueço
o
Eu,
que não acorda
e
me fadiga…

18 outubro 2005

no caminho que faço

Sinto
o
passo que passo,
piso-o,
risco-o,
descalço,
como quem escreve,
febril,
e
bebe água que ferve...
Marco-o,
passo a passo,
como quem cinzela na pedra,
corpo de mulher,
ou
flor de Abril…
Sangro-o,
de passo em passo,
como rio que nasce,
e
morre nuvem,
longe do mar...
Sinto-o
no tempo que tomba,
como quem amassa o pão
como quem vai,
e
não para,
nem que caia
no chão…

Sinto, passo a passo os passos que passo no chão…

17 outubro 2005

outonos

Arvorei-me sob um Castanheiro, sem procura de cor, nem sombra.
Sentei-me apenas para O sentir e deixar que o tempo se extinguisse num nada e se transformasse em quietude.
Silenciámos segredos na cumplicidade da nossa fantasia, embalados nas folhas que se coloriam de Outonos…
O dia desbarulhou-se , só para não nos incomodar e ali ficamos a fingir-nos vivos em transparências de vento, até ao regresso do tempo…

13 outubro 2005

estar

Onde estás?
No eu!
No qual?
No teu!

In “apontamentos para um manual da serenidade” ou como o amor pode ser uma simbiose que nos equilibra o sentir e o existir, sem que se perca o olhar…

12 outubro 2005

intensidade

Dói-me,
a angústia de não-me-ser-inteiro-no-Eu, (como a calçada da minha cidade que se desenha nas sombras, entre os brancos-e-negros que lhe existem no Ser…)
Dói-me,
o sentir…

São dores do re-nascer…

11 outubro 2005

no desenho da calçada...

Passeio-me sem destinos, nas ruas da cidade grande, na cidade que me nasceu no Eu…
Procuro respirares e com eles o sentir da cor e do ir…

Sento-me,
onde os poetas sofreram, onde poetizaram a dor do existir e deixo-me abraçar, envolver, como quem pousa o cansaço no regaço de mãe.

Fico, entre a chuva e o vento…

Ah,
quando morrer quero ir com este vento e renascer na cor do rio-mar que me olha o horizonte.

Ah,
como queria, com desejo quase animal, ser o vento que leva a vela da nau, a bolinar…a bolinar no céu…

Passeio-me nesta cidade, onde a luz reinventa os cinzentos e as sombras em azuis, nas calçadas…

Sento-me,
onde os poetas choraram e deixo-me diluir na chuva que procura o mar e o fecunda…

10 outubro 2005

sou

Procuro nas nuvens que passam,
as lágrimas que verti,
olho-as ao vento,
disformes,
brancas,
negras,
e
procuro atento,
pedaços de mim.

Sou,
arqueólogo,
sem história,
que anda sem rumo, por ali.

Sou,
lágrima esculpida ,
azul,
verde,
carmim…
Ah, velas sem navio,
mar sem fim,
deixem-me ser nuvem,
palhaço-criança,
jardim...

Procuro no céu,
a ave migrante
que fugiu de mim...

Sou,
flamingo azul,
que anda por aí,
perdido,
réu,
navegante...
Ah,
Sou,
poema sem véu,
peregrino sem (a)deus,
pintor sem tela,
sem Tempo,
Livro
esquecido,
evaporado,
queimado-vivo…

Sou,
sem chama,
neste mundo,
letra só,
sem sentido!

07 outubro 2005

as mãos

Tenho duas mãos que se abrem e fecham, como flor, mas só uma vida inteira as ensina a ser cor…
Fecho as mãos como quem fecha os olhos, mas o universo escorrega entre os dedos que rezam…
Só o olhar sabe guardar o Universo, vendo-O…

In “ Apontamentos para um manual da serenidade” ou como para sentirmos devemos sobretudo, estar de fora

06 outubro 2005

dar passos

Quando te sentires cego, fecha os olhos e vai…

In “ Apontamentos para um manual da serenidade” ou como mais vale caminhar com o sentir do que desenhar passos de sombras que nos invadem o Eu...

05 outubro 2005

cores

A terra, tem todas as cores do arco-íris…
As cores todas do arco-íris , são de um castanho febril…
Os gira-sois,
As rosas,
As violetas,
O alecrim
As papoilas,
Os narcisos,
As dálias,
O jasmim...
Ah e as outras,
Sobretudo as outras que nascem flor…
Trituram os sais da terra,
E vestem-se da sua cor…

04 outubro 2005

astrolábio(s)

Acendo o olhar, como quem se perde no fumo, escondido na chama que se desfaz numa acendalha, diluído na luz…
Queimo os passos, no mergulho que dou, nos acasos da vida, guiado pelos astrolábios do sentir…
Acendo o olhar , qual fósforo do existir…
E
Vou…

03 outubro 2005

sede

Bebi um verso,
Sôfrego de cor,
No calor-do-não-estar-aqui…
Bebi-o!
Todo,
para respirar
e
perder-me no olhar,
sem dor,
por ali…

não uso tempos, nem agendas ou instrumentos outros que meçam pedaços do existir. é jeito meu. por isso passar de um ano para o outro é cousa...