04 março 2004

tinha tempo...

Como quem abre uma caixa de chocolates e retira um com uma mão e outro com o olhar, dei comigo entre duas reuniões e com tempo…
Entre o conforto do táxi e o envolver-me na multidão, optei por seguir-me nos passos e deixar-me ir com o movimento, mimetisando-me nos cheiros, nos olhares, nas vidas de todos os que comigo se embalavam nos subterrâneos da Cidade Grande.
Movimentei-me na multidão, em pedaço dela. Tinha tempo…
Inventei uma história para cada uma das vidas que se isolavam do olhar e o escondiam no chão que se orientava em carris infindos, em movimentos rápidos como quem transporta destinos.
Senti-me desconfortado com a frieza do Ver de cada um e não resisti em vasculhar imagens de outros tempos, de outras paragens, de outras emoções e calhou-me na sorte a recordação de uma menina de sorriso atrevido, em terras de Africa, e que me fazia corar com o olhar e deixei-me navegar. Tinha tempo…
Quando voltei à multidão, a minha saída estava algures entretida com os passos apressados de outros, mas não os meus. Saí a correr em paragem próxima e corri desesperado para um táxi. Olhei relógio minuto a minuto, transpirando cada segundo que me corria nas veias.
Atrasado, chateado, comigo e com a multidão, limpei a angustia e fixei-me em cada um dos rostos que me penetravam com interrogações. Voltei ao meu mundo, ao meu espaço, longe da multidão, à ausência do sentir, do Ver e do tempo…

Sem comentários:

não uso tempos, nem agendas ou instrumentos outros que meçam pedaços do existir. é jeito meu. por isso passar de um ano para o outro é cousa...